sexta-feira, dezembro 22, 2006

O crescimento econômico

Objeto de campanhas presidenciais e assunto sempre em pauta, o crescimento econômico é, certamente, um tema de enorme relevância. Atualmente, com grande freqüência temos ouvido falar em um pacote de medidas, a serem implantadas pelo governo, visando atingir um crescimento condizente com a capacidade brasileira.

Muita gente acha que é esse o papel do governo, promover o crescimento. Isso é um erro. Obviamente que o Estado tem um papel a cumprir, mas está longe de ser o principal player desse jogo.

Visando promover o desenvolvimento econômico, cabe ao Estado gerar condições mínimas de segurança e estabilidade, de modo que os agentes privados tenham a tranqüilidade para exercer suas atividades e a certeza de que colherão os frutos de seu trabalho. Incluo dentro dessas condições mínimas o acesso à saúde e à educação, que além de influenciar na produtividade dos trabalhadores, ajudam no fortalecimento do Estado de Direito. Fora disso, qualquer intervenção estatal na economia torna-se amplamente discutível.

Passando para uma análise mais aplicada, vejamos a atual situação do Brasil. O país, apesar de possuir uma grande capacidade de crescimento, vem observando, ano após ano, seu PIB crescer de maneira inexpressiva. Como já discuti em textos anteriores, isso se deve à falta de um ambiente de negócios propício, que gere aos investidores, internos e externos, um cenário favorável para que apliquem seu dinheiro. Faltam condições para que a poupança vire o investimento que promove o crescimento da economia. Para resolver esse problema foi criado um pacote de mudanças.

O dito pacote será benéfico em alguns itens. Mas, deixa de lado diversos fatores que são de suma importância. Primeiro, a intenção do governo é fazer com que a taxa de juros caia consistentemente, de modo que deixe de travar com outros setores da economia um duelo desleal na captação de recursos. O objetivo é aumentar a taxa de investimento da economia. A idéia é louvável, mas incorreta. É certo que a taxa de juros não poderá cair muito mais do que já caiu. Todas previsões indicam que, em 2007, haverá um excesso de demanda em relação à produção nacional. A princípio, isso não é um grande problema, visto que possuímos superávit comercial e câmbio valorizado o que permite atender a esse excesso de demanda com importações, sem grandes impactos na inflação. Porém, não sabemos até quando durará nossa boa fase comercial e a desvalorização cambial oriunda do aumento das importações representará um impulso inflacionário (tornando diversos produtos mais caros dentro do país) e um obstáculo à importação de produtos estrangeiros. Ou seja, embora o governo possa se dar ao luxo de propor grandes reduções da taxa de juros, não poderá mantê-las indefinidamente baixas. Também, não podemos ancorar um projeto de crescimento econômico em bases tão tênues como um próspero período de bonança comercial.

Pequenos pacotes como esse, estão longe de resolver o problema. São necessárias grandes reformas estruturais, para que o país possa retomar a rota do crescimento. De que adianta lançar um pacote para o crescimento se ao mesmo tempo promovem um aumento do salário mínimo, que além de aumentar os gastos públicos com o funcionalismo ainda piora a deplorável situação de nossa previdência? Nas palavras de membros do governo, parte dos reflexos positivos do pacote certamente foram anulados por esse aumento no salário mínimo.

O governo deve, de uma vez por todas, entender que a melhor coisa que pode fazer pela economia é libertá-la de suas garras. Para tanto, deve promover profundas reformas em diversas áreas, buscando sempre garantir um ambiente de negócios estável e propício, além da liberação de recursos, hoje nas mãos do governo, para o uso mais eficiente do setor privado, para que, esse sim, promova o crescimento da economia.

segunda-feira, dezembro 18, 2006

Mente: Produto do Corpo?

Existem idéias que parecem fazer sentido, que são aceitas por muitos, e que, se analisadas cuidadosamente, levam a auto-contradições e absurdos que ninguém jamais aceitaria.

Uma dessas idéias, à primeira vista perfeitamente aceitável, é a de que a mente, ou os processos mentais, sejam produto do corpo (ou, mais especificamente, do cérebro). Faz sentido, não faz? O corpo tem diversos órgãos que produzem diversas substâncias diferentes, e não há dúvida de que o cérebro está diretamente ligado aos nossos pensamentos; dada a sua enorme complexidade, pode ser que os processos que nele ocorrem (sinapses neurológicas, liberação de químicos, etc) dêem origem aos nossos pensamentos, desejos e emoções. Não há como provar definitivamente que isso seja o caso, mas é uma possibilidade, não é mesmo?

Suponhamos que essa possibilidade seja de fato aceitável, e aceitemo-la. Que conclusões se seguiriam logicamente? Bom, o pensamento é produto das condições físicas de nosso cérebro, da mesma forma que a saliva é o produto de nossa glândula salivar. As características particulares da saliva que produzimos depende dos processos que se dão na glândula salivar; duas glândulas em estados diferentes produzirão salivas de tipos diferentes (com mais ou menos enzimas, por exemplo). Da mesma forma, o pensamento que a mente terá depende das condições particulares e específicas do cérebro; se a sinapse B ocorrer ao invés da sinapse A, isso terá conseqüências no produto do cérebro, ou seja, no pensamento.

Agora imaginemos um ser humano qualquer, e digamos que ele acredite no socialismo. Usualmente, diríamos que esse sujeito é socialista porque acredita que o problema da pobreza poderia ser resolvido com o planejamento da economia, que a desigualdade social é uma injustiça, etc. Mas pela nossa suposição essas explicações são inaceitáveis; a real causa da crença socialista é o fato de que, no cérebro do rapaz, ocorrem certas sinapses e um certo químico age de certa maneira de modo que o produto de tudo isso é a ideologia em questão.

O pensamento nada mais é do que o resultado natural de uma certa condição cerebral, assim como o tipo de saliva o é da condição da glândula. Assim, não existe pensamento verdadeiro ou falso, da mesma forma que não existe saliva verdadeira ou falsa. Mesmo o que o nosso senso comum diz ser a mais absurda das crenças, digamos, que a lua é feita de queijo, é a conseqüência natural e adequada de uma certa disposição dos componentes do cérebro, nem mais nem menos correta que nenhuma outra.

Alguns apelariam a uma definição pragmática de verdade, nessas linhas: “de fato, não existe saliva verdadeira ou falsa, mas existe saliva que cumpre ou não sua função, de ajudar na digestão dos alimentos. E existem pensamentos que ajudam o homem a sobreviver e a agir no mundo, e é isso que é o pensamento verdadeiro”. Mas essa defesa é impossível, pois a própria escolha de uma finalidade é uma idéia, e o julgamento de se uma finalidade foi ou não atingida também é um ato mental, e assim, pela própria teoria materialista, apenas o produto natural do cérebro em condições X.

Logo, uma visão materialista consistente não dá espaço para a existência de verdade ou falsidade. Assim, não é possível afirmar que a própria tese materialista esteja correta, pois isso seria contrariar sua conclusão lógica. Crer que os pensamentos são determinados por condições físicas do mundo material implica afirmar a não existência de verdade, e portanto implica não crer na própria crença. Portanto, é impossível aceitar o que diz o materialismo sem cair em contradição.

terça-feira, dezembro 12, 2006

Breve introdução à Hipótese de Mercado Eficiente (HME)

O texto de hoje e o meu próximo tratarão de dois conceitos recorrentemente abordados em trabalhos de Finanças, e que, para leitores não familiarizados com a área, podem gerar confusões. Serão exploradas a noção de eficiência dos mercados e, em seguida, a definição da taxa livre de risco, buscando o esclarecimento de tais idéias.

O número de investidores ativos ou indiretos, que se envolvem com o mercado financeiro através de fundos, tem aumentado no Brasil nos últimos anos e, assim, o interesse por trabalhos que elucidem o seu funcionamento tem crescido. O jargão financeiro, contudo, pode desencorajar essa busca por conhecimento e oportunidades. Explicarei algumas noções simples, mas fundamentais para a teoria na qual esses trabalhos se baseiam, começando pela eficiência dos mercados.

A idéia de mercados eficientes é uma hipótese na qual se baseiam diversos modelos financeiros e, apesar de difícil de ser sustentada teoricamente e empiricamente ("anomalias do mercado"), é essencial para o entendimento do mercado financeiro.

Um mercado é considerado eficiente quando os preços dos ativos reproduzem plenamente a informação disponível e refletem novas informações de forma precisa e imediata. Mercados eficientes são frequentemente confundidos com mercados perfeitos, mas, ao contrário da eficiência, a perfeição implica ausência de fricções como custos de transação ou impostos.

A eficiência é fruto da racionalidade dos agentes e da competição. Os agentes, baseados num entendimento correto do processo de criação de valor, formulam suas expectativas de preços fazendo o melhor uso da informação disponível e, assim, a refletem de forma precisa nos preços. A competição garante que novas informações sejam reproduzidas imediatamente nos preços, uma vez que os participantes do mercado estão a procura de oportunidades de lucro e prontos a analisar toda essas informações.

As avaliações irracionais, por serem descorrelacionadas, se anulam e caso investidores apresentem o mesmo comportamento irracional suas influências nos preços são eliminadas pelos especuladores racionais.

Como consequência da eficiência os preços mudam apenas quando os valores intrínsecos mudam, quando algum acontecimento altera a previsão do valor presente dos fluxos de caixa futuros. Deste modo, as variações de preços são aleatórias, pois o fluxo de informações é aleatório.

Contudo, como os investidores desviam da racionalidade (moda, etc.) e a competição nem sempre é plena, diversos níveis de eficiência são observados nos mercados. Assim, é possível que, por exemplo, análises fundamentalistas (que utilizam dados econômicos e contábeis) e até análises técnicas (dados de mercado) tenham alguma capacidade de prever preços futuros.

sábado, dezembro 09, 2006

Comparação Espúria

“But to make the comparison applicable, we must compare Communism at its best, with the régime of individual property, not as it is, but as it might be made. The principle of private property has never yet had a fair trial any country; and less so, perhaps, in this country.”
(Mill, John Stuart. Principles of Political Economy,
Book II. Distribution, Chapter I: Of Property)



Discussões acerca da melhor forma de se organizar economicamente uma sociedade não são fáceis. Mesmo que se concorde com alguns fatos objetivos, pode-se não concordar com a desejabilidade desses fatos. Por mais que seja razoavelmente seguro afirmar que a economia de mercado seja superior a qualquer outra forma de organização econômica já experimentada quanto à capacidade de prover materialmente a sociedade, ainda assim é possível acreditar ser injusta propriedade privada (premissa desse tipo de organização). Dentro dessa discussão há, contudo, um argumento inadmissível: a distinção entre o socialismo teórico e o real, ou, a comparação entre o “capitalismo” e o socialismo teórico.

O argumento tem duas formas possíveis. Pela primeira, se compara o socialismo (e, especialmente o comunismo) por aquilo que “prevêem” os livros com o “capitalismo” ou a economia de mercado que de fato ocorre, pelo menos em alguma medida. Pela segunda forma, argumenta-se que a comparação entre essa sociedade de economia de mercado e os regimes socialistas que ocorreram na história não é adequada, pois tais regimes socialistas não representam de fato aquilo que o socialismo é.

Obviamente, deve existir congruência nas comparações. Não se pode comparar uma teoria com os resultados práticos de outra teoria e vice-e-versa. Não faz sentido, por exemplo, comparar as hipóteses de um modelo microeconômico com os resultados da aplicação prática de um modelo macroeconômico. Da mesma modo, não faz sentido argumentar a superioridade do socialismo em teoria em relação ao que, aparentemente, são as “mazelas do capitalismo”.

Ademais, existem motivos para manter uma discussão desse tipo no nível dos resultados práticos, apenas. Afinal, o propósito do debate é estabelecer a melhor forma de organização prática da sociedade e não qual sociedade é preferível do ponto de vista teórico. São irrelevantes as vantagens do socialismo se sua aplicação não pode ser obtida ou se qualquer tentativa dessa aplicação esbarre em um número altíssimo de mortes, algo que muitos argumentam como implicação necessária da implantação do socialismo. Dentro desse contexto, o contraste deve necessariamente ocorrer entre aquilo que o socialismo entregou de fato à humanidade com aquilo que a economia de mercado entregou de fato à ela.

Não se deixe enganar, caro leitor.

segunda-feira, dezembro 04, 2006

Por um ganho de competitividade

Já é fato corriqueiro ver o Brasil nas últimas colocações de rankings mundiais. Educação, saúde, violência, corrupção ou crescimento econômico, não importa. Estamos sempre lá, ocupando “honrosas” posições no fim da lista.

Dessa vez, não foi diferente. Em estudo analisando a competitividade dos BRIC’s, as economias emergentes que apresentam maior potencial de desenvolvimento, ficamos, mais uma vez, na última colocação (veja aqui). O ranking analisa diversos aspectos das economias em questão, divididos em três grandes grupos: custo e disponibilidade de capital, custo fiscal e institucional e custo operacional. Em suma, o estudo analisa o ambiente de investimentos no país de uma maneira ampla.

Passemos brevemente por cada um dos grupos acima. Primeiro vem o custo e disponibilidade do capital. É consenso que o combustível do crescimento econômico é a poupança. É uma escolha intertemporal que qualquer sociedade deve fazer, “poupar agora para consumir mais depois”. O que é poupado hoje possibilita investimentos visando o aumento da capacidade produtiva de amanhã. Sendo assim, para que um país cresça consistentemente, é necessário que tenha acesso à poupança que financie sua expansão produtiva. É disso que trata o primeiro grupo, a quantidade e o preço, na forma da taxa de juros, da poupança disponível na economia.

Na atual situação, a maior parte da poupança interna brasileira tem sido destinada a financiar os déficits governamentais. Não sendo isso o bastante, também é prática comum recorrermos à poupança externa para esse fim. O grande problema é que quão mais deficitário é um governo, maiores são as taxas de juros que deve oferecer para angariar a quantidade de recursos necessários para fechar seu orçamento.
Com isso, caso uma empresa resolva expandir suas operações e, para tanto, necessite de financiamento, terá de concorrer com a taxa de juros paga pelo governo. Se ele é adepto da frouxidão fiscal e, portanto, muito deficitário, paga altas taxas de juros. A essa taxa elevada, a maioria dos investimentos torna-se impeditiva, gerando um entrave ao crescimento econômico. Há o desvio de capital do setor privado, onde certamente teria melhor uso, para o público com toda sua ineficiência. Com isso, pode-se entender porque reinam os juros altos e a falta de capital destinada a financiar projetos produtivos.

Já no segundo grupo, temos a questão da tributação, que pode representar um entrave ao surgimento e bom desempenho de empresas, dificultando sua expansão e tornando suas operações menos lucrativas. Além disso, esse grupo engloba também o ambiente institucional de um país. São exemplos de fatores importantes nesse ambiente a segurança jurídica, nível de corrupção, trâmite burocrático, leis trabalhistas entre outros. Um conjunto composto por altos impostos, pouca segurança jurídica, leis trabalhistas mal formuladas, altos índices de corrupção e entraves burocráticos ao funcionamento da economia colocam o Brasil, mais uma vez, distante do desejado.

Por fim, o último grupo, é referente a custos diretamente operacionais como custo e produtividade da mão-de-obra, custos de logística e transporte, matriz energética, insumos e etc. Mais um grupo de fatores que afeta em grande medida o desempenho da economia onde nosso país deixa a desejar.

A situação do Brasil nos três grupos acima, além de se colocar como um entrave ao bom aproveitamento dos recursos nacionais, ainda representa um forte fator negativo a entrada de recursos estrangeiros no país. Pois, por aumentarem os riscos envolvendo investimentos no país, fazem com que seja exigido maior retorno por parte dos agentes, restringindo muito a gama de projetos que recebem esse tipo investimento.

A vergonhosa posição do Brasil no ranking mostra uma verdade irrefutável. Embora muitos argumentem que o problema do país é o excesso de práticas neoliberais no passado recente, a verdade vai justamente no sentido oposto. O grande problema do Brasil é, e sempre foi, a falta de um ambiente que promova de maneira eficiente o funcionamento do livre-mercado. Em um misto de ignorância com vontade de se perpetuar no poder, as lideranças políticas brasileiras caíram em sua própria arapuca populista. Já não sabem mais sua função dentro do país, e vivem às custas de uma utopia redistributiva, se afastando cada vez mais do que realmente melhoraria a vida de todos. Afinal, do que adianta melhorar a distribuição de renda, se o que se está distribuindo é a pobreza?

quinta-feira, novembro 30, 2006

Por uma nova (porém antiga) concepção da alma

A alma é, hoje em dia, vista exclusivamente como objeto da religião. E sem dúvida a religião tem muito a dizer sobre ela. No entanto, poucos sabem que, tradicionalmente, a alma era objeto da filosofia.

Platão e Aristóteles pensaram e escreveram exaustivamente sobre o tema. No final das contas, a visão platônica acabou dominando o imaginário popular. Se imaginamos a alma como um fantasma, ou como um “eu” que controla o corpo assim como um motorista guia um carro, é a concepção platônica que temos em mente. E é natural que uma pessoa, ao ouvir falar desse conceito de alma como fantasma que vive no corpo, se pergunte “que evidências temos de que tal coisa exista?”; e que, na falta de tais evidências (que de fato não existem), acabe por concluir que a alma não exista.

Totalmente diferente é a concepção aristotélica. Segundo ela, a alma é o princípio vital do ser vivo. Mas o que isso quer dizer? Melhor do que tentar explicar em termos abstratos é mostrar concretamente, para que do caso concreto cheguemos ao conceito geral.

Um ser vivo unicelular e um coacervado (entidade não-viva mais próxima do ser vivo) têm muitas semelhanças. Ambos são constituídos por um conjunto de componentes que desempenham certas atividades; mas qual a diferença entre os dois? No coacervado todos os componentes se comportam de forma caótica, enquanto que no ser vivo todos eles são ordenados ao mesmo fim: a sobrevivência do indivíduo e a preservação da espécie. Esse ordenamento interno é a vida do ser. Ele não é causado por nada material (não é nem um corpo nem uma energia); necessita, portanto, de um princípio distinto da matéria que faz do indivíduo um todo organizado. Esse princípio ordenador, ou princípio vital, é a alma.

Todo ser vivo, portanto, tem alma, que é a responsável por sua organização. E essa atividade ordenadora da alma manifesta-se em diversas funções. Nos seres mais simples, elas se resumem apenas à nutrição, metabolismo, crescimento e reprodução (é o caso das plantas). Os animais, por sua vez, têm sentidos, movimento próprio (auto-iniciado), memória. Mas notem que todas essas variadas atividades dependem necessariamente da matéria: sem olho não pode haver visão, e tampouco pode haver movimento sem um corpo que se move.

O ser humano é ele também um animal. Mas sua alma possui uma atividade que lhe é única: a razão, ou seja, a capacidade de especulação, de raciocínio, de abstração. Não somos, portanto, um fantasma preso à matéria; somos o próprio composto de alma e corpo: um corpo vivo, sensível e pensante. Corpo e alma estão intimamente ligados, de modo que um está constantemente agindo sobre o outro, mas são, ainda assim, princípios distintos.

A alma humana sem corpo é um ser incompleto. Não somos intelectos etéreos que habitam um corpo temporariamente, e tampouco somos animais de existência puramente material. Somos animais racionais, capazes de pensar racionalmente, de forma abstrata, e de escolher nossas ações (ainda que essa decisão sofra todo tipo de influência corpórea não-racional). Tendo feito essa breve incursão filosófica, não parece mais tão estranha a crença cristã de que, ao final dos tempos, terá lugar a ressurreição da carne, na qual todas as almas serão re-unidas aos seus corpos. Só assim pode o homem existir plenamente enquanto tal.

domingo, novembro 26, 2006

Trocando vidas por sexo...

Continuando a análise de trabalhos relevantes sobre temas polêmicos, buscarei apresentar o resultado e o argumento central do estudo realizado por J. Donohue III e S. Levitt, em maio de 2001, no artigo "The Impact of Legalized Abortion on Crime". Para isso, complementarei o modelo da teria econômica do crime que utilizamos em posts anteriores.

Como vimos, a decisão de um indivíduo de realizar um crime é semelhante à de realizar um investimento, ele buscará maximizar os retornos futuros esperados dos seus atos considerando o risco envolvido e uma certa restrição moral. Basicamente, estará pensando nos ganhos esperados menos a probabilidade de ser pego e condenado que multiplica a punição esperada. Todos estes fatores são funções da gravidade do crime, isto é, quanto maior a gravidade, maiores os ganhos esperados, as chances de ser pego e condenado e a punição.

No momento da escolha o agente trará estas expectativas futuras a valores presentes, descontando os fatores por uma taxa que seria capaz de representar o seu grau de imediatismo ou inconseqüêncialismo. Criminosos, curiosamente, tendem a utilizar uma taxa maior para a punição, fazendo com que seu peso no momento da decisão seja subestimado. Assim, o crime poderia ser inibido com um aumento nas chances do indivíduo ser capturado, na eficácia investigativa, na severidade do castigo, na restrição ética (educação) ou então reduzindo o imediatismo, que é uma cegueira temporária capaz de obnubilar a moral.

Diversas evidências de que a legalização da prática do aborto contribuiu significativamente para a redução da criminalidade nos Estados Unidos, são apresentadas no artigo de Donohue e Levitt. Uma drástica redução nos crimes foi observada nos estados que legalizaram o aborto, cerca de duas décadas após a medida. O estudo mostra, estatisticamente, que metade desta redução pode ser atribuída à legalização.

Os autores apresentam explicações à idéia de que jovens nascidos após a legalização, em média, seriam menos propensos ao crime. Estas crianças não teriam crescido cercadas por condições desfavoráveis à formação ética e moral, não nutririam um sentimento de rejeição e não seriam criadas por mães muito jovens, solteiras, pobres e que utilizassem drogas, durante e após o parto. O aborto teria possibilitado um controle, um instrumento, para a escolha do momento ótimo para a gravidez, que seria determinado pela idade, educação e renda da mulher.

De acordo com o paper, a legalização do aborto teria feito com que pais que não desejassem seus já concebidos filhos, pudessem se livrar deles de uma forma legítima e, assim, não acabassem criando, com negligência, as futuras crianças. Deste modo, o número de jovens com traumas, distúrbios psicológicos, vícios e demais mazelas teria se reduzido significativamente no período analisado. Como os indivíduos com este tipo de perfil seriam os mais propensos ao crime, por preferirem, de uma forma desmedida, o agora ao futuro e serem incapazes de respeitar os princípios da honestidade e do pudor, a legalização teria diminuído esta problemática turba eliminando os potenciais imediatistas devassos.

Como descrita pelos autores, a análise feita é positiva e não normativa. Deste modo, o estudo não se preocupa com a questão das implicações éticas e morais do aborto. É certo que a legalização do aborto tenha criado uma opção segura às mães, que não estivessem preparadas para a formação de uma criança, de postergar o fardo da criação e evitado que jovens, desvirtuados e potencialmente perigosos à sociedade, viessem a existir. O problema é a omissão de que, num segundo momento, uma sociedade impulsiva, promíscua e irresponsável possa estar sendo formada, que despreza o valor da vida e não se importa com as consequências de seus atos. Na busca pela eliminação de imediatistas, novos inconsequentes podem estar sendo criados. Indivíduos formados deste modo sempre buscarão meios para consertarem seus erros, independentemente dos custos, e não para evitá-los. Poderão chegar a trocas mais absurdas do que a do sexo sem proteção pela vida de um (futuro) ser humano.

domingo, novembro 19, 2006

In Memoriam

“Underlying most arguments against the free market is a lack of belief in freedom itself.”
(Milton Friedman)



Infelizmente, morreu na última quinta-feira um dos defensores da liberdade: o economista Milton Friedman. Friedman, não obstante sua permanente “ideológica” luta pelo livre-mercado e pelas liberdades individuais, é certamente um dos maiores economistas do século XX, tendo feito importantíssimas contribuições à ciência. Contudo, busco neste texto atentar não para tais contribuições, mas para três propostas do gigante economista que objetivam maximizar a liberdade individual, com base na diminuição do Estado, na melhora de sua eficiência e na liberdade de escolha.

A primeira delas diz respeito à política monetária e ao controle da inflação. Um dos motes da obra de Friedman foi elucidar a dificuldade dos programas de estabilização da economia, além do poder que tem a autoridade monetária de gerar instabilidade. Com base nisso, Friedman advoga uma regra clara e consistente de expansão da oferta de moeda. O argumento subjacente é que como a regra é sabida pelo mercado, não haverá diferença entre as expectativas de preço e a inflação efetiva. Logo, variações na oferta de moeda não terão impacto sobre a atividade econômica, poupando a sociedade das roubo que é a inflação.

Uma segunda proposta é a introdução de school vouchers (vales-escola), para aprimorar a qualidade do ensino e ceder a todos os pais, independentemente da renda, a liberdade de escolher a educação dos filhos. Ao invés de prover gratuitamente educação, o Estado cederia vouchers às famílias com crianças em idade escolar, sendo os vouchers direito de adquirir uma quantidade de dinheiro em educação. As vantagens imediatas dessa proposta seriam colocar as escolas públicas em situações de concorrência aprimorando sua qualidade e dar liberdade de escolha para os pais, inclusive para inteirar com a própria renda o poder de compra dos vouchers para adquirir educação melhor ainda.

Por fim, há a proposta do imposto de renda negativo. Tal proposta tem como objetivo diminuir a pobreza e funciona de forma simples: estabelece-se uma renda anual como renda mínima para que uma família viva (o equivalente a uma cesta de consumo que garanta suas necessidades básicas) e aquelas famílias com renda menor a essa recebem a quantia complementar como transferência de renda do Estado. Essa configuração tem a grande vantagem de permitir a total saída do Estado da provisão de serviços não essenciais à sua natureza, como educação, saúde e previdência.

Certamente, minhas palavras e o exíguo espaço não são capazes de demonstrar a lucidez dos argumentos de Friedman. Para aqueles que desejam saber mais, a leitura recomendada é o livro Capitalism and Freedom.

quarta-feira, novembro 15, 2006

Welfare ou Warfare: Triste Escolha

Há poucos dias o partido Democrata americano obteve uma importante vitória eleitoral: conseguiu a maioria de representantes no congresso e no senado. Isso não é mérito algum do partido. Muito pelo contrário: ele se encontra desestruturado, suas propostas falham em animar a população americana e figuras importantes cometem gafes grosseiras (John Kerry insinuou que quem serve no exército o faz por não ter tido educação de qualidade; o que obviamente pegou muito mal).

O motivo dessa virada eleitoral tampouco foi uma grande mudança de crenças ou valores da população. Interpretou-se que talvez os americanos estivessem desistindo da recente guinada conservadora e voltando aos ideais liberais, mas isso não é o caso; ao mesmo tempo em que os democratas venceram as eleições, os referendos sobre o casamento homossexual deram vitória conservadora. O grande culpado pela virada dos Democratas nos EUA é o partido Republicano. E a causa é uma: a guerra no Iraque.

Saddam Hussein era um tirano violento. Um dos poucos pontos positivos da guerra foi sua queda; mas como o presente nos mostra, a retirada desse mal liberou males novos, talvez até mais perigosos do que o velho ditador. Pois uma coisa é certa: se a maioria xiita, até então oprimida, conseguir impor seu ideal de governo ao país, então a ditadura secular de Saddam será lembrada com saudades dentro e fora do Iraque. Mas aqui já sonho alto demais, dado que não há qualquer perspectiva de instalação de um governo iraquiano estável e independente do poder americano.

Para os EUA a situação também é terrível. Vidas são perdidas e uma quantidade inconcebível de recursos é gasta (o que fez com que o governo se afunde em dívidas). O Partido Republicano tem aparecido como defensor da moral tradicional e de uma economia menos controlada pelo Estado. Isso na teoria. Na prática, ambos esses objetivos foram sacrificados para sustentar uma guerra sem sentido e sem possibilidade de sucesso. Os Republicanos mostram-se tão estatizantes quanto os Democratas; nos EUA há a escolha entre dois matizes de intervencionismo: “welfare” e “warfare”.

Os democratas, com sua defesa do Estado de bem-estar social, de salários mínimos mais altos, de extensa redistribuição de renda, de regulamentações e impedimentos ao livre mercado, representam o “welfare”: sob o pretexto de construir uma sociedade mais justa e com melhor qualidade de vida, promovem a pobreza generalizada, o desemprego e a falta de oportunidades. Já os republicanos representam o “warfare”: sob o pretexto de tornar o mundo um lugar melhor e de proteger o país de seus inimigos externos promovem guerras sanguinárias e extremamente custosas. Uns empobrecem a sociedade torrando seus recursos em políticas que pioram a vida de todos; os outros empobrecem-na gastando sua renda para explodir casas e matar famílias a milhares de quilômetros dali.

Mas tenho dado crédito demasiado ao discurso dos dois partidos. Há muitos eleitores que votam em um dos dois exatamente por defender o “welfare” em oposição ao “warfare” ou vice-versa. Mas no final das contas ambos são iguais: os Republicanos continuam as políticas sociais dos Democratas, e criam novas, e os Democratas mantêm as guerras, isso quando não são eles que as declaram.

A derrota dos republicanos não foi uma derrota do livre mercado e da moral cristã. Foi a derrota do fracassado “warfare” e a concessão de mais uma chance ao “welfare”; a permuta de duas posições que, na prática, são indistinguíveis.

sexta-feira, novembro 10, 2006

Vale a Pena?

O tema escolhido para este texto, certamente, passou pela mente de todos os que se mantiveram pelo menos um pouco informados esta semana. A condenação de Saddam Hussein à forca me fez pensar na necessidade da pena capital, os seus resultados práticos, os modos com os quais as principais religiões tratam a condenação... Buscarei, agora, trazer um pouco do que encontrei à respeito do assunto.

Creio que a exposição do tema poderá ser feita de uma maneira mais concisa e que as abordagens deontológicas, morais ou religiosas poderão ser deixadas em segundo plano (e até evitadas, dada a extensão do tema e as poucas linhas disponíveis) se apenas a face econômica for analisada. Tratarei, então, das relações entre pena de morte e utilidade, considerando o uso de recursos e os incentivos gerados.

O Utilitarismo, como um critério de sustentação de preferências e validação, requer intrusões e juízos de valor mínimos. Considerando a relação custo-benefício busca a maximização da utilidade, isto é, dos benefícios gerais, das boas consequências, da felicidade, do prazer e do bem estar. Pela sua objetividade, é também aplicado em certas questões jurídicas. É possível, portanto, analisar a questão da pena capital sob a ótica da utilidade gerada. Veremos se utilizando a lógica e/ou estudos empíricos conseguimos diferenciar, em termos de utilidade, situações com e sem a presença da pena de morte.

A prisão perpétua pode ser considerada um meio "substituto imperfeito" para a pena de morte. Defensores do encarceiramento mostram que os processos judiciários de casos relacionados à pena de morte são mais dispendiosos e exigem um maior tempo de análise por se tratar de uma tomada de decisão irreversível. Por outro lado, os que defendem a pena colocam que os custos extraordinários na corte são compensados pela colaboração que o réu busca e é encorajado a demonstrar, uma vez que facilitar a investigação e se declarear culpado fazem com que ele não seja condenado a pena capital (no caso dos EUA), e pela economia de recursos que acontece, pois a pena seria capaz de deter novos crimes do acusado (considerando-se eventuais fugas e problemas dentro do cárcere) ou desincentivar novos crimes, por ser um exemplo forte de castigo. Não existem estudos que sejam capazes de concluir quais dos métodos de punição é o mais eficiente.

Como vimos no texto "O funcionamento de uma mente criminosa" (Tavista, 20 de maio de 2006), de Werther Vervloet, a decisão de um indivíduo de realizar um crime é semelhante à de realizar um investimento. O agente, involuntariamente, estará pensando em algum retorno esperado dado um certo nível de risco. Ponderará seus possíveis ganhos com a probabilidade de ser pego, de ser condenado e com a punição que receberia. O que inibiria o crime? Um aumento nas chances dele ser capturado, na eficácia investigativa ou então na severidade do castigo.

Faz todo o sentido, então, pensar que a mais rigorosa punição seja capaz de desincentivar a criminalidade. Contudo, isto não é observado empiricamente, pelo menos não de uma forma conclusiva. Isaac Ehrlich (1975) analisou a questão dos incentivos, considerando os benefícios e punições esperados dos criminosos. Apesar de obter resultados favoráveis à influência da pena na redução dos homicídios, críticas ao modelo utilizado nas regressões e à um provável viés na escolha do período estudado fazem com que as conclusões percam credibilidade.

Thorsten Sellin (1967) realizou quatro testes comparando: perídos de tempo em que a pena seria abolida e depois restaurada, regiões com e sem a pena de morte, momentos antes e após execuções amplamente divulgadas e números de mortes de políciais em regiões onde assassinatos de policiais eram e não eram casos castigados com a pena final. Ele não encontrou evidências do efeito preventivo gerado pela existência da pena de morte. Porém, críticos argumentam que ele não distinguiu os tipos de homicídos no estudo (que alterariam o tipo de punição) e não manteve o ceteris paribus, entre outros equívocos.

Richard Lempert (1981) demonstrou que, curiosamente, na Grã-Bretanha, um grau elevado da austeridade penal, a pena capital, reduzia as chances do preso ser condenado por homicídio, grande parte era considerada insana. A partir de 1965, quando a pena foi abolida, a relutância por parte do juízes à condenação não mais existia e os números mostram que o número de condenados por homicídio se elevou, assim como o número de criminosos incapacitados mentalmente sofreu uma drástica queda.

Como pudemos ver, não é possível fazer conclusões definitivas quanto às utilidades geradas pelos métodos de punição analisados (considerando o requerimento de recursos e criação de desincentivos). Edward Leamer (1983) econométricamente evidencia como os estudos relacionados ao tema são viesados e os resultados são sensíveis às crenças prévias dos pesquisadores. Além deste entrave à conclusões mais robustas, a escassez de dados também impossibilita análises mais precisas.

segunda-feira, novembro 06, 2006

A imprensa e o totalitarismo

Ao tratarmos de governos totalitários, é comum vermos que um de seus primeiros passos sempre é, de alguma forma, restringir a liberdade de imprensa. Fato esse que, nada mais é do que uma necessidade para que tal governo mantenha-se no poder. A mídia, por meio dos meios de comunicação em massa, é a maneira mais eficiente de difusão do conhecimento. Nada mais razoável, então, que regimes autoritários e antidemocráticos exerçam controles sobre os meios de comunicação visando manter longe do conhecimento popular fatos que lhe seriam prejudiciais. Desse modo, o ataque à liberdade de imprensa é um forte indício de que algo mais assustador está por vir.

Assim sendo, ao olharmos para o Brasil, temos motivos para começar a nos preocupar. No curto período de tempo entre a reeleição de nosso Presidente e o dia de hoje, já são contabilizadas algumas agressões diretas a órgãos de imprensa, ditos oposicionistas, por parte do governo ou de pessoas ligadas a ele. São ataques contra vários meios, imprensa escrita, revistas, periódicos eletrônicos e assim por diante. Grandes, pequenos. Regionais ou nacionais, tanto faz. A única semelhança que guardam entre si, é que não se omitem em informar os escândalos nos quais está envolvido o atual governo. A seguir comentarei dois fatos de maior relevância.

O primeiro ocorreu no dia seguinte ao segundo turno da eleição presidencial, na chegada de Lula à Brasília. Militantes petistas e acessores de membros do governo hostilizaram jornalistas e repórteres que, como eles, aguardavam a chegada do presidente, mas não para festejar e sim para cobrir o evento. Em um certo momento, os petistas em questão decidiram ser uma afronta ao PT a presença de jornalistas de “entidades contra o Presidente Lula e o PT” e resolveram partir pra cima de alguns jornalistas. Ao ser indagado sobre o assunto, Marco Aurélio Garcia, presidente do PT disse ser o fato um sinal para que a imprensa inicie um processo de “auto-reflexão”. Enquanto hostilizavam os jornalistas, os petistas exclamavam, entre outras asneiras, que o povo havia absolvido o Lula e não existia mais lugar para abutres como eles no Brasil e que entre uma ditadura e dar liberdade para a imprensa, eles ficavam com a ditadura.

Já o segundo caso é muito mais preocupante. Sob o pretexto de ouvir depoimentos para uma suposta investigação interna, a PF intimou jornalistas da revista Veja a depor. Chegando lá, os jornalistas viram que não se tratava de nada daquilo que foi dito. Era, na verdade, uma represália contra algumas matérias que haviam sido publicadas por eles na revista. Foram coagidos, ameaçados e intimidados por membros da PF, que faziam perguntas referentes a assuntos que em nada se relacionavam com o tema central da investigação de fachada. Somado a isso, ainda foram impedidos de consultar seus advogados ou falar com outras pessoas que não os agentes federais. Para mais detalhes sobre o assunto: aqui e aqui.

Esses dois fatos, somados ao passado de declarações anti-imprensa de Lula e do PT - e seus inúmeros projetos que visam “democratizar”, “descentralizar”, “moralizar” e “fiscalizar”, entre tantas outras coisas, a imprensa- mostram uma grave tendência que vem surgindo em nosso país. Se antes da reeleição Lula e seu partido usavam da máquina pública para beneficiar os veículos de mídia que os apoiavam, agora estão usando-a para atacar aqueles que lhes opõe. O que muitos temiam, e poucos alertavam, de fato ocorreu. Aos petistas, a estrondosa vitória no segundo turno soou não só como uma absolvição dos crimes cometidos no passado, mas também como um aval para que se cometam crimes no futuro.

Se no passado o PT já demonstrou ter pouco apreço à democracia, agora ele dá mostras de nem saber de sua existência. E, com isso, vai, passo-a-passo, minando as bases do Estado de Direito. Claro que a situação ainda está longe de ser crítica, mas aqueles com olhares mais atentos já começam a perceber os traços do projeto de poder que está em andamento no Brasil. Essa foi apenas mais uma peça que se encaixa no quebra-cabeça que é o plano dos petistas para o futuro do Brasil.

quarta-feira, novembro 01, 2006

A Estabilidade de Preços Não Pode Ser Proposta Política

Há no pronunciamento feito no início dessa semana pelo governador eleito do Estado de São Paulo, José Serra, uma frase muito interessante:

“Devemos a Fernando Henrique Cardoso a obra monumental que devolveu ao Brasil o valor da moeda. Obra que seu sucessor preservou, à qual felizmente associou-se.”

A estabilidade de preços (ausência de inflação) faz parte também da campanha petista. O presidente recém reeleito reiterou nos debates, repetidamente, como feito seu a manutenção da estabilidade de preços em seu governo. Argumenta-se neste texto que a estabilidade de preços não pode ser tida como proposta política e que seu uso eleitoral não passa de um embuste, ludibriando os mais ignorantes.

Primeiramente, deve-se esclarecer que a ausência de inflação não é um benefício concedido pelo Estado, como a redistribuição de renda. A causa da inflação, grosso modo, é uma oferta de moeda acima da demanda por moeda, diminuindo seu valor. Uma vez que o responsável pela oferta de moeda é o Estado, é ele o causador da inflação. Estabelecido esse ponto, usar a estabilidade de preços como proposta política é argumentar “vote em mim porque, se eleito, eu não estuprarei sua mulher”, ou seja, estelionato.

Esclarecido o ponto acima, pode-se pensar em como inflação aparece pela primeira vez. Em um contexto monetário arcaico, no qual a moeda é um meio de troca baseado em quantidades de metal; para garantir a qualidade e peso de cada moeda, o Estado passa a as marcar. Assim, surgem as diferentes moedas (o pence, o xelim, etc) cada uma representando uma quantidade de metal. Nesse caso, a inflação surge quando o Estado diminui a quantidade de metal na moeda, sem alterar seu valor nominal. É natural, portanto, que o mercado ajuste os valores por um aumento de preços, de forma que os mesmos bens sejam trocados pelas mesmas quantidades de metal. Nesse caso, fica claro que a inflação não passa de um roubo que o Estado promove, o “imposto inflacionário.” Como se pode usar como ponto de campanha eleitoral uma promessa desse tipo?

Fica claro, portanto, que a estabilidade de preços é da mesma natureza do direito à vida e à propriedade, inclusive se confundindo com o último se a interpretarmos à luz do parágrafo acima. Vender a ausência de inflação como o bolsa-família e como cotas raciais no ensino superior não passa de enganação eleitoral.

Ademais, é forte nesse país a corrente econômica que acredita, contrariando ampla evidência empírica, que a inflação é fenômeno correlacionado ao crescimento econômico e que deve se subordinar a ele.

Por esses motivos, no Brasil, a estabilidade monetária é vendida como proposta política. A inflação está sob controle há mais de uma década e ainda assim é um tema central do debate econômico, em detrimento das causas da estagnação econômica do país, por exemplo. E o é justamente porque não se entende que a estabilidade de preços é um direito tão natural quanto o direito á propriedade.

A estabilidade de preços, logo, não deve ser usada como proposta política.

sábado, outubro 28, 2006

Não Existe Almoço Grátis

“There’s no such thing as a free lunch” - diz um popular ditado da língua inglesa, muito caro às ciências econômicas. Em português, “não existe almoço grátis”. A lição que ele ensina, embora muito simples, é comumente ignorada. Antes de se explicitá-la, no entanto, é preciso distinguir entre duas possíveis interpretações, uma superficial e outra mais profunda.

A primeira, superficial e até errada em muitos casos, é aquela que lê no ditado a afirmação de que toda a humanidade é interesseira e egoísta. “Não existe almoço grátis”, ou seja, se você acha que alguém lhe dá algo de graça, engana-se; por trás de todo presente dado existem segundas intenções e desejos velados. Se ganhamos algo hoje, é porque seremos cobrados amanhã.

Nem toda aparente boa ação é desinteressada; isso ninguém nega. Mas também existem aquelas feitas por bondade e amor, sem nada exigir. É digna de pena a opinião segundo a qual o homem é puramente egoísta, muito embora o egoísmo seja uma realidade evidente da existência humana. Assim, o ditado é um lembrete de que as aparências de boa fé e honestidade podem nos enganar. Entretanto, uma interpretação mais profunda existe.

Uma interpretação mais profunda, ainda que mais simples. “Não existe almoço grátis”; isso não quer dizer que quem recebeu o almoço terá que pagar por ele de alguma forma. Mas se não for quem comeu, será outra pessoa. Todo almoço é pago por alguém. Muitas vezes ganhamos algum benefício, algo que ajuda a melhorar nossa vida, e não arcamos integralmente com seu custo. Como a riqueza não sai do nada, se não fomos nós que pagamos, foi alguma outra pessoa. Num almoço entre amigos, se um deles comeu mais do que pagou, é porque outro pagou mais do que comeu.

Na política essa simples verdade é esquecida. Parte da população quer um serviço, e não quer pagar por ele; quem pagará? O governo! Mas o que isso significa? Significa que a outra parte da população pagará pelo serviço por meio de impostos. Seria essa uma situação equivalente ao almoço entre amigos? De forma nenhuma: entre os amigos, aquele que pagou a mais o fez voluntariamente, por amizade, e ao fim da refeição todos estavam mais felizes do que antes. Já no caso do governo ocorreu o exato oposto: quem pagou a mais do que recebeu foi obrigado, sob ameaça de violência física, a fazê-lo; imposto é o contrário de contribuição voluntária; o serviço provido pelo Estado é a negação da ação caridosa.

O governo não gera, nem poderia gerar, riqueza nenhuma; apenas tira-a de uns para dá-la a outros (perdendo uma parte dela no processo). Esperamos que ele arque com o custo de escolas, faculdades, ruas, hospitais, novas empresas, filmes. Assim, aceitamos implicitamente que pessoas sejam forçadas a pagar por coisas das quais não poderão usufruir. “Não existe almoço grátis”; se você não estiver pagando, pode ter uma certeza: alguma outra pessoa está.

quarta-feira, outubro 25, 2006

Nossa Precária Previdência

Devido à extensão do tema, focarei o texto na descrição do problema da Previdência no Brasil e buscarei responder as seguintes questões: por que economistas, frequentemente, se preocupam em discutir o tema; e por que o Governo continua seguindo uma política insustentável que está levando o país ao fracasso?

Das despesas federais de 2005, cerca de R$ 360 bilhões, 89% são protegidas por leis e pela Constituição. Destes "gastos blindados", 75% são despesas obrigatórias e crescentes: pessoal ativo (R$ 50 bilhões, tendo aumentado 85% em termos reais nos últimos 18 anos), inativos e pensionistas (R$ 43 bilhões, 310%), benefícios assistenciais e subsidiados (R$ 76 bilhões, 1362%) e previdência (R$ 96 bilhões, com elevação de 342%). Os 11% restantes, normalmente alvos de cortes, são destinados a gastos correntes (custeio da máquina) e investimentos em infra-estrutura (atualmente 0,5% do PIB)!

Estas informações seriam suficientes como uma resposta para a primeira pergunta. Um Estado muito grande e os impactos decorrentes de um leviatã desenfreado nas instituições já fariam economistas perderem o sono. Creio, porém, que a menção da questão fiscal seja muito importante e deva ser feita. Uma elevação da dívida pública em relação ao PIB ocasionaria um aumento da taxa de juros, impossibilitaria uma diminuição da carga tributária (atualmente próxima a 40% do PIB), desincentivando a produção e o investimento. O caminho lógico a ser seguido para a melhora da situação fiscal brasileira seria o congruente à solução da questão dos gastos assistencialistas, especialmente os referentes à previdência, que crescem a taxas elevadas.

Para o contato com uma das propostas de soluções factíveis deste problema recomendo a leitura da sugestão de reforma para a Previdência elaborada por Paulo Levy e Fábio Giambiagi, ambos do Ipea. Com medidas simples, propuseram mudanças que beneficiariam o sistema: desvinculação entre o piso previdenciário e o salário mínimo, correção das aposentadorias apenas por um determinado índice de preços (evitando aumentos reais) e aumento gradual da idade mínima são algumas delas.

Detalhes da precariedade do sistema previdenciário também são abordados por economistas, como o dilema da informalidade e o do aumento da expectativa de vida dos beneficiários (enquanto a idade média dos que se aposentam por tempo de contribuição é 55 anos...) que agravam o problema. O nível dos gastos com previdência é, como mostrou Claudio Haddad (Valor, 5 de outubro de 2006), elevadíssimo e desproporcional se relacionado ao tamanho da população de inativos (6% da população brasileira, por exemplo, tem mais de 65 anos). Isto é, não apenas o déficit e o aumento dos gastos com assistência são preocupantes, como também encontramo-nos numa situação, referente ao nível dos gastos, anômala. Cerca de 13% do PIB deste ano será destinado à seguridade social. De acordo com a estimativa da OCDE, este gasto deveria estar entre 3,5 e 6,5%! A investigação das causas e dos efeitos desta distorção também são relevantes e estudadas.

A explicação da manutenção da estratégia perdedora está relacionada às dificuldades de se aprovar uma reforma previdenciária. Estas complicações podem ser entendidas através da compreensão de que os custos de tais mudanças seriam observados e sentidos diretamente pela população e os benefícios seriam perceptíveis apenas a longo prazo. A pesquisa Ipespe/Valor (início de setembro) mostrou que a grande maioria dos brasileiros rejeita novas mudanças nas regras das aposentadorias. O imediatismo brasileiro faz com que a solução se distancie. Intervir nesta questão de estado de bem-estar resultaria num processo de degradação (obviamente injusta) da imagem e força do partido no poder. Como nenhum candidato à presidência parece ter capital político suficiente para tratar esta questão em uma profundidade desejável, o Brasil provavelmente continuará cometendo seu "suicídio a conta-gotas".

sexta-feira, outubro 20, 2006

Intervenção estatal nos preços, um erro grotesco

Um erro comum que costuma acometer muitas pessoas é o de achar que o governo deve intervir no preço de alguns produtos. Seja por pensarem que eles são tão essenciais que devem ser mais baratos e, à primeira vista, mais acessíveis a todos, seja por pensarem ser injusto as empresas cobrarem o “quanto querem” por eles. Mas, isso não passa de algo extremamente maléfico para a economia e apenas mais uma daquelas situações aonde o governo mostra sua face de “anti-Midas”.

Imagine um produto considerado muito importante para a subsistência de um brasileiro médio, digamos, o arroz. A primeira vista, pode parecer ótimo para os cidadãos mais pobres que o governo estabeleça um preço máximo para a comercialização do arroz, de modo que os mesmos possam consumir mais do produto.

A intenção pode até ser das melhores, porém uma análise mais cuidadosa mostra que o que ocorrerá, de fato, só prejudicará essas pessoas que deveriam ser beneficiadas. Com o estabelecimento de um preço máximo, abaixo daquele preço potencial de livre mercado, o governo estará permitindo que pessoas que antes não teriam acesso ao arroz, passem a demandá-lo de maneira efetiva, ou seja, há um acréscimo na demanda. Porém, ao mesmo tempo em que isso ocorre, aqueles produtores que são menos eficientes e possuem custos de produção mais altos passam a incorrer em prejuízos, pois sua operação lhes era lucrativa apenas no preço que vigorava anteriormente. E mesmo os produtores mais eficientes, com essa queda forçada no preço de seu produto, terão de produzir uma menor quantidade.

Portanto, o resultado líquido final, será uma queda considerável na produção total de arroz. Antes, o arroz era mais caro, porém havia uma maior abundância do produto na economia e mais gente podia consumi-lo. Agora, apesar de estar com o preço menor e, desse modo, mais acessível para as camadas mais carentes, há uma quantidade menor de arroz sendo ofertada e menos pessoas tem acesso a ele.

Além disso, situações como essa, de alta demanda e baixa oferta, resultado direto de uma ação governamental atrapalhada, costumam representar um forte incentivo para a criação de mercados paralelos. Ou seja, produtores passarão a guardar uma parte da sua produção para vender de maneira ilegal, a preços mais altos, satisfazendo aqueles dispostos a pagar mais pelo arroz e que não estavam sendo atendidos devido à falta do produto no mercado. E, se o governo quiser fazer valer sua lei e coibir essa prática, terá que ser gasta uma quantia maior em fiscalização, o que resultará em maiores gastos governamentais e, conseqüentemente, maiores impostos sobre a população.

Assim, podemos concluir que ao tentar usar seu poder e intervir no mercado, mesmo buscando melhorar a vida de alguns, o governo apenas conseguirá piorar a vida de todos, sendo os grandes prejudicados aqueles que o governo visava ajudar, pois terão ainda mais dificuldade em conseguir comprar os produtos que sofreram a intervenção. Ademais, se o tamanho do erro não for percebido rapidamente, visando diminuir os custos da produção de arroz, o governo pode decidir estabelecer um preço máximo para os insumos que são utilizados em sua produção, depois nos insumos dos insumos, e assim por diante, interferindo cada vez mais na economia e tornando-a menos eficiente.

segunda-feira, outubro 16, 2006

Questões Sobre Política Educacional

A educação é uma variável de fundamental importância para o crescimento econômico no longo-prazo. Ela permite aumentar a produtividade dos trabalhadores, produzindo mais bens e serviços com quantidades de recursos menores. Contudo, é inegável que o nível educacional tanto dos países desenvolvidos quanto dos países em desenvolvimento está abaixo do nível ótimo, fato evidenciado pelo grande número de pessoas com educação menor do que desejam. Este texto busca, a partir dessa premissa discutir o papel do Estado na educação.

São dois os motivos pelo quais a educação não ocorre em seu nível ótimo na sociedade. O primeiro deles é o fato de que a educação é uma externalidade positiva. Uma externalidade positiva ocorre quando o agente que arca com os custos de um bem ou serviço não é o único a receber seus benefícios, ocorrendo falta de demanda por esse bem ou serviço. Uma pessoa mais educada é uma externalidade positiva no sentido que a sua educação não beneficia unicamente essa pessoa: sua educação pode significar um voto mais consciente ou uma melhor probabilidade de descobertas tecnológicas, eventos que beneficiam a sociedade como um todo.

O segundo motivo a ser discutido se deve a problemas no mercado de crédito. Por mais que, muito provavelmente, um indivíduo mais educado tenha sua renda aumentada, dificilmente ele conseguirá um empréstimo bancário para arcar com os custos de sua escola ou faculdade. Uma possível explicação para isso pode ser o fato de que o financiamento da educação, ao contrário do financiamento de um carro ou de um imóvel, não tem um bem a ser usado facilmente como garantia.

Os dois parágrafos acima podem ser usados como argumentos para justificar algum tipo de intervenção estatal no mercado de educação. Outro argumento é o fato de que pode ser desejável por si só uma sociedade onde todos sejam educados. O que a possível necessidade de intervenção estatal na educação não justifica, contudo, é a provisão pública de serviços educacionais (escolas e universidades controladas pelo Estado).

Serviços públicos carecem de incentivos para se aprimorar e por isso são normalmente de qualidade inferior aos do setor privado. Tal situação não é diferente na questão educacional. Uma alternativa seria a distribuição de vales educação (vouchers) para as parcelas da população sem renda suficiente para adquirir serviços educacionais. Tais vales poderiam ser usados em quaisquer escolas, promovendo a concorrência entre estas últimas e, conseqüentemente, uma melhoria na qualidade da educação. Em um contexto assim é bem provável que o Estado consiga um resultado melhor, dado o que gasta com educação, de que na oferta destes serviços.
Outra vantagem do sistema de vouchers é dar a escolha aos responsáveis pelos alunos sobre qual deverá ser sua escola, promovendo maior liberdade. Enfim, a questão educacional é, sem dúvida, extremamente importante, e muitas mudanças podem ser feitas.

sexta-feira, outubro 13, 2006

Falta de Demanda Gera Pobreza? Não!

Sociedade pobre. Desemprego, fome, prédios abandonados, educação baixa, degradação social e moral, pessimismo, falta de perspectivas. Graves problemas, todos esses, e todos ligados à economia. Perguntemos, então, a um economista representativo de sua profissão, qual o diagnóstico e a receita dele para esses males. “Ora, é-me óbvia a causa de toda essa pobreza: a população vive uma vida muito austera, consome muito pouco! Como é possível que uma firma de sucesso se estabeleça se ninguém consome seus produtos? Se consumirem mais, gerarão empregos, que por sua vez gerarão mais renda, e assim mais empregos, num círculo virtuoso com direção à riqueza! Lembre-se: cada centavo extra que é gasto gera mais riqueza, e cada centavo poupado é um emprego tirado de um trabalhador”.

A profissão na qual pretendo em breve ingressar padece de sérias deficiências! A visão exposta acima, apesar de completamente errada, é partilhada por muitos economistas. O erro dela se baseia numa simples inversão de papéis: mais consumo gera riqueza, afirmam. O correto seria “mais riqueza propicia consumo maior”. Se eu torrasse, em um dia, toda a poupança da minha família, viveria como um príncipe durante esse dia; mas estaria mais rico? De jeito nenhum; eu empobreceria. E o que é a poupança? Poupança é aquilo que foi produzido mas não foi consumido (ao invés de guardarmos diretamente nossos produtos, guardamos aquilo que aceitamos em troca deles: o dinheiro, que dá no mesmo). Da mesma forma, um país que consuma tudo aquilo que ele produz e ainda o que havia poupado não fica mais rico, e sim mais pobre.

A pobreza nunca se deve à falta de demanda. Não é por falta de mercado consumidor que uma sociedade é pobre. Enquanto alguém tiver necessidades e desejos não satisfeitos, não há falta de demanda. E se todo mundo tiver todos os seus desejos já satisfeitos, então não há pobreza nenhuma: todas as pessoas já têm tudo aquilo que querem; nada lhes falta. O entrave ao crescimento e a causa da pobreza é a falta de oferta: é a incapacidade de se produzir mais do que se produz atualmente.

A poupança e o comedimento, tão mal-vistos por economistas de certa linha de pensamento, são essenciais para o crescimento econômico. Sem poupança, todo mundo tem que viver sempre produzindo diretamente aquilo que consome. Com alguma poupança, é possível sustentar pessoas que trabalhem em projetos de longo prazo.

Numa tribo indígena na qual não exista poupança, na qual se consome instantaneamente tudo o que se caça, todos os homens têm que sempre estar caçando para matar a fome; se um não caçar, falta comida. Mas se eles conseguirem poupar um pouco do alimento, então alguns índios poderão não ir à caçada e se dedicar à produção de armadilhas e armas, que permitirão, no futuro, a captura de um maior número de animais. Durante o tempo da produção desses utensílios, eles são sustentados pelo alimento que foi poupado. É assim, por meio da poupança e do uso dela para produzir coisas de valor, que sairão da pobreza.

Não é por falta de vontade de consumir que há pobres. Não existe excesso de poupança. Ao contrário, é o excesso de consumo e de imediatismo, é a incapacidade de poupar, que contribui para que tantas sociedades permaneçam na mais abjeta pobreza. Para quem não estuda economia, essa conclusão deve parecer óbvia; mas os economistas têm que lutar muito para se acostumar com ela.

domingo, outubro 08, 2006

Por que 46.662.365 votaram no Lula?

Como explicar os votos confiados ao Lula, dada a conjuntura política brasileira, na qual as promessas e os planos dos partidos que concorrem ao Governo Central praticamente coincidem (pelo menos nas áreas que mais interessam a maioia do eleitorado) e casos de corrupção envolvendo muitos dos dirigentes do Partido dos Trabalhadores surgem com uma frequência vergonhosa? Para entender a razão destes votos busquei separar os eleitores petistas em poucos grupos para que conseguisse analisar suas motivações de uma forma mais precisa. Com esse esforço cheguei aos seguintes grupos que apoiam a releição de Lula: o dos "iludidos" e o dos "desiludidos" (como veremos a seguir, a falta de informação é a principal responsável pela formação destes grupos). Certamente existe um terceiro grupo formado pelos que se beneficiariam diretamente de uma nova gestão petista, os membros do partido e as pessoas próximas a eles. Porém, como somam uma parcela ínfima da população e como quaisquer argumentos direcionados a eles (para que considerassem o voto na oposição) seriam inúteis, focarei apenas nos dois grupos citados a cima.

Começarei a análise pelo grupo dos "iludidos", que se segmenta em dois subgrupos. O primeiro deles é o dos "sonhadores", composto por uma pseudo-elite intelectual e por militantes mais radicais que apenas não votaram na então candidata Heloísa Helena porque sabiam que seriam votos a menos em Lula e, consequentemente, chances a mais do Alckmin levar a eleição para o segundo turno. As explicações mais comuns, deste sub-grupo, para seus votos são as de que o PT é o único partido com potencial para realizar uma revolução (uma transformação radical em nosso país) ou é o que mais dá importância para parte social. Normalmente não votam no PSDB porque não aprovaram suas gestões e o consideram um partido neo-liberal, formado por capitalistas e que ainda vendeu parte de nosso para os estrangeiros. Digo que estão equivocados ou sendo incoerentes. Por quê? Este sub-grupo é marcado pela imaturidade de pensamento e uma fidelidade as idéais de esquerda que já se provaram fracassadas até na prática. Defendem uma sociedade planejada pelo Estado, igualitária, justa, que promova o crescimento econômico e priorize a ética. Pensam nos fins (que na verdade são conflituosos), mas não nos meios. Para que uma economia seja controlada de uma forma centralizada toda a liberdade individual e o direito à propriedade, incentivos-base para o trabalho, seriam abdicados.

Considero-os desinformados, também, porque acreditam que a solução para quase tudo é vontade política e não conseguem entender que todas as decisões e ações de um governo afetam uma sensível relação de equilíbrios causando distorções e prejudicando a alocoção eficiente, e desejada pelos indivíduos, dos recursos, afetando assim o crescimento econômico sustentável. Por fim, poucos deles enxergam que o PSDB também é um partido de esquerda. Grande parte dos projetos sociais do governo Lula teve início com FHC. Metade do dinheiro conseguido com as privatizações foi destinado a projetos sociais, que este sub-grupo do eleitorado do Lula tanto prezam, enquanto poderia ter sido utilizado para pagar as dívidas do Estado (destino da outra metade do dinheiro), reduzindo os juros, o risco-país, a taxa de juros e atraindo investimentos... Resumindo, estão errados ao defenderem o socialismo, iludem-se ao pensar que o PT realizará mais investimentos nas áreas sociais do que o PSDB e se esquecem das falcatruas do Governo petista, que elevou a corrupção a um nível inédito no país.

O segundo dos subgrupos dos "iludidos" é constituído pelos "comprados" que viram suas rendas reais subirem nos últimos meses com a apreciação do real, a queda dos preços dos alimentos, pelos que se contentaram com o crescimento artificial resultante de uma política monetária expansionista (parte de um ciclo stop-and-go) e, principalmente, pelos beneficiados pelo Bolsa Família. O problema central deste sub-grupo é a falta de informações relacionadas à insustentabilidade das políticas que trouxeram estes aumentos de renda e à nocividade de políticas assistencialistas para a formação de uma sociedade. Os preços dos alimentos não caíram graças ao PT e provavelmente voltarão a subir, o real se desvalorizará, o crescimento alcançado com a redução da taxa de juros via o aumento na taxa de emissão monetária perderá cada vez mais seu efeito (com os agentes refazendo suas expectativas) trazendo apenas inflação e, em algum momento, não haverá como pagar o Bolsa Família para todos... O que o Governo de Alckmin fará em relação a esta situação? Dada a insustentabilidade apresentada buscará fontes de crescimento alternativas, mas certamente continuará com o programa Bolsa Família! O PSDB não planeja se suicidar politicamente, o que injustifica a insegurança dos "comprados" e a recusa de votarem no PSDB.

O grupo dos "desiludidos" é o formado da maneira mais curiosa. Fazem parte do grupo os que a ciência política chama de "conservadores", que optam, ou simplismente dão um peso maior, pela a escolha do conhecido, o candidato mais familiar e normalmente o que está no poder. Esse tipo de escolha pode ser fruto da satisfação com a situação atual e preferência pela manutenção do status quo (são aversos ao risco), ou então, da indiferença (os políticos seriam essencialmente o mesmo tipo de ser, interessado apenas na obtenção do poder para usufruto próprio).

É importante que os integrantes do grupo dos "desiludidos", e todos os demais, entendam que, como vimos à cima, todos os "pontos positivos" que atualmente os eleitores do Lula destacam do Governo petista, como o Bolsa Família, serão mantidos pelo PSDB e que, se o Lula for re-eleito, os brasileiros estarão consentindo com toda a corrupção que foi exposta e estarão incentivando esta forma de condução política.

quinta-feira, outubro 05, 2006

A diferença entre Geraldo e Lula

Muitas pessoas, ao saberem que votarei no Geraldo, me perguntam se eu realmente acho que existe um abismo de diferenças entre os dois. Como aprendiz de economista que sou, respondo que depende.

E de fato, depende. Depende de qual área estamos falando. Se tomarmos como base os governos FHC e o governo Lula, veremos que, no âmbito econômico, os dois se assemelham muito. Ambos beberam da mesma fonte no que diz respeito à política econômica adotada, empurrando com a barriga as reformas que de fato fariam o país entrar em uma rota de crescimento sustentável.

Acredito que, caso eleito, Geraldo e seu governo apresentarão uma melhor capacidade administrativa, darão alguns passos importantes e até realizarão algumas reformas menores e, certamente, alcançarão níveis de crescimento superiores aos que vem sendo observados. Mas não acredito que vá ser o Geraldo que dará um “jeito” no país. Creio que nossa economia necessite de muito mais do que um “choque de gestão” para poder crescer. São necessárias reformas importantes como a previdenciária, a trabalhista, a tributária entre tantas outras. E acho que assim como Lula, o candidato tucano não conseguirá angariar capital político para tanto.

Sendo assim, apesar de possuir uma certa superioridade nesse quesito, podemos dizer que o Alckmin não é lá tão diferente do Lula, e acredito que em termos econômicos seu governo não seria muito diferente. Assim como ocorre na questão do posicionamento político, já que ambos são candidatos assumidamente esquerdistas e de partidos esquerdistas. Ou seja, não é o posicionamento político e econômico que faz com que o Alckmin seja tão melhor que Lula aos meus olhos.

O que, então, de fato diferencia Alckmin e o PSDB do Lula e do PT? Um simples fato: o respeito à democracia e a ética. Nesses quatro anos de Lula tivemos todo tipo de ocorrência que denotam claramente a tendência totalitarista de nosso presidente e seu partido. Mensalão, dossiê-gate, grampos telefônicos, e toda aquela infinidade de bandidagens que nos acostumamos a ouvir.

Não vou afirmar que a corrupção e a falta de ética são exclusividades do governo petista, seria um tanto leviano de minha parte. Corrupção, de fato, sempre existiu no Brasil e no mundo, não só na política quanto em qualquer atividade humana. O ‘X’ da questão é o tratamento dado à mesma.

No governo Lula, a corrupção tornou-se generalizada e o modo de governar. A falta de ética tornou-se um requisito obrigatório para manutenção do poder aos olhos dos petistas, que não fazem a menor cerimônia para adotá-la, a mando do próprio Lula. Eles não conhecem limites e já demonstraram que estão dispostos a fazer qualquer coisa para se manter no poder. Desde a compra de votos, do congresso e da população, até a fabricação de falsas evidências e o uso da PF como instrumento político, de espionagem e acusação. Se alguém duvida disso, é só contar nos dedos quantos da alta cúpula petista saíram ilesos dos escândalos ocorridos. Até o Lula consegue. Usando a mão esquerda, ainda por cima. Todos foram tão longe em suas safadezas que , ao estourarem os escândalos, nem a famosa camaradagem petista conseguiu salvá-los.

Há aqueles que ainda tentam defender o modo de governar petista, dizendo que não fizeram nada que nunca tenha sido feito antes. Acusam o governo FHC de irregularidades e dizem que só porque é com o PT tudo é amplificado. Não defenderei o PSDB aqui, mas o fato é que apesar de terem surgido algumas denúncias, pouca coisa foi provada e nada de grande magnitude e envolvendo a alta cúpula do governo tucano, ao contrário do que tem ocorrido com os petistas. Se realmente ocorriam fatos semelhantes na época, por que a oposição (PT) não fez nada?

Por fim, temos na pessoa de Geraldo Alckmin alguém, até agora pelo menos, acima de qualquer suspeita no quesito corrupção. Uma longa carreira política, ocupando cargos importantes e uma reputação ilibada. Uma pessoa ponderada, com uma boa formação intelectual e valores morais mais sólidos. E como a tendência de uma pessoa honesta é cercar-se de pessoas também honestas, temos motivos o bastante para crer que um eventual governo “Alckmista” venha a ser bem mais honesto que o atual.

domingo, outubro 01, 2006

Os possíveis resultados das eleições

No momento em que escrevo este texto, algumas das urnas da eleição de hoje começam a ser contabilizadas. Nas duas últimas semanas, tanto a possibilidade de segundo turno quanto seu possível resultado passaram por mudanças. Nesse exato momento, a combinação de eleição e escândalo do dossiê tem três possíveis resultados, cada um deles delineando um contexto para a atuação daqueles que são hoje situação e oposição. Analisarei um por um estes contextos, enfatizando as prováveis atitudes dos jogadores políticos do Brasil e como cada contexto contribui para as reformas necessárias ao desenvolvimento do país.

No primeiro caso a eleição vai para o segundo turno e Geraldo Alckmin vence. O PT volta à oposição. O mais provável, nesse caso, é que o PT na oposição passe a agir como sempre agiu quando na oposição: obstruindo as reformas necessárias (as mesmas que aprovou quando no governo), procurando sempre que possível desestabilizar, etc. Obviamente, tal situação não é benéfica para o país – se o fosse, o desempenho do Brasil nos anos FHC seria melhor – contudo, as outras possibilidades são ainda piores.

Em um segundo caso, Lula vence as eleições (é irrelevante se no primeiro ou no segundo turno), mas tem sua candidatura impugnada pelo Superior Tribunal Eleitoral devido às irregularidades do escândalo do dossiê. Nesse caso, o PT se portará não apenas como se tivesse perdido as eleições como também (como já age atualmente) acusará a atual oposição de golpismo, desrespeito à democracia – como se as leis não fossem elas mesmas algum tipo de representação do povo. Soma-se a isso a tolerância que algumas partes (se não a maioria) da imprensa tem com relação ao PT, produto da revolução cultural, e constitui-se uma situação pior que a primeira.

A última situação possível é a situação em que Lula é eleito e permanece presidente pelo segundo mandato inteiro. Nesse caso, partindo da hipótese controversa de que o segundo governo Lula se portará de forma semelhante ao primeiro, o país permanecerá na situação em que está: assolado pelo populismo, com uma economia carente que cresce a taxas mínimas, sem fortes garantias de direitos de propriedade, institucionalmente instável. Tudo isso com dois agravantes: um governo marcado por denúncias de corrupção e uma população para quem as urnas são capazes de absolver criminosos.

Concluindo, independentemente do resultado das eleições, a situação do Brasil permanecerá frágil.

quarta-feira, setembro 27, 2006

Duas Vias para a Existência de Deus

Existe Deus? Como saber? É difícil, impossível até, pensar diretamente sobre o que está completamente fora da nossa experiência. Mas também não é possível deixar essa questão fundamental de lado só porque ela parece insolúvel à primeira vista. Façamos, então, o caminho que parte do familiar para chegar ao desconhecido. Voltemos nossa atenção para o mais prosaico dos seres: digamos, um cachorro. Todo mundo entende o que é um cachorro, ou seja, conhece sua essência (essência é aquilo que é inteligível em um determinado ser, que faz com que ele seja o que é). Mas o conhecimento da essência desse ser não nos diz se ele existe de fato ou não. Afinal, também entendemos o que é um unicórnio, mas nem por isso acreditamos que ele exista. Com cachorro o mesmo vale: poderia perfeitamente não existir cachorro algum, e meu entendimento do que é um cachorro continuaria inalterado. Conclui-se, portanto, que essência e existência são coisas separadas; não é nada na essência do cachorro que faz com que existam cachorros.

Nada pode ser a causa de sua própria existência. Se não fosse assim, algo teria que existir antes de si mesmo (para poder ser a causa de si mesmo), o que é um absurdo (nenhum cachorro é seu próprio pai). Ora, se a essência dos seres não se confunde com a existência e se nada pode causar a si mesmo, então todo ser que existe tem como causa algum outro ser. O universo consiste numa enorme malha ou cadeia de seres, os quais dependem uns dos outros para existir. Bom, então ou existe algum ser que não dependa de outro para existir e que seja a causa primeira de todos os outros seres, ou então o que existe é uma cadeia de seres que não existem por si sós. Mas numa cadeia dessas nenhum dos membros teria como existir, pois cada um deles dependeria de outros, que por sua vez dependeriam de outros, etc. É preciso algum ser externo a essa cadeia e existente por si só para poder causar a própria cadeia. Caso contrário, teríamos de assumir que o universo veio do nada, ou que causou a si mesmo, ambos absurdos. Portanto, sabemos que existe um ser cuja existência não depende de outro; um ser tal que sua essência é a existência, e que por sua vez é a causa primeira de todos os outros. É a esse ser que chamamos Deus.

Voltemos às coisas simples da experiência para retomar o itinerário rumo ao metafísico e desconhecido. Nosso universo não é puro caos. Muito pelo contrário, conhecemos diversas leis que regem o comportamento dos corpos e dos seres vivos; o fato de conseguirmos entender e diferenciar um cachorro de uma pedra já significa que existe alguma ordem nas coisas (e também na nossa mente que percebe e compreende), uma limitação ordenada que faz com que algo seja uma rocha e não um cão.

Não há nenhum motivo lógico para existir qualquer lei ou ordem na realidade; não há, a priori, nenhuma necessidade pela qual pedras devam cair ao invés de subir ou girar em espiral e mudar de cor ou ainda agir de forma totalmente imprevisível. Elas só se comportam de um jeito determinado e previsível por causa de alguma lei, princípio ordenador, que não é logicamente necessário. E o que são leis e ordem? São o produto de alguma mente que as impõe na realidade. Se meu quarto está organizado, é porque alguém quis assim; ele nunca se organizaria por razão nenhuma. Da mesma forma, se uma ordem maior existe no universo (e se não existisse nenhum de nós viveria por um segundo sequer) é porque alguém a quis e a fez valer. Chamamos esse “alguém” de Deus.

Se algo existe, então Deus existe. Sem Deus, a existência de qualquer coisa torna-se uma impossibilidade lógica, e fica-se obrigado a afirmar que tudo foi causado pelo nada.

sábado, setembro 23, 2006

Voto nulo, a pior opção

Nossa democracia vive um momento delicado. Apesar dos diversos escândalos envolvendo nosso atual presidente e seu partido, não vemos nenhuma mudança nas pesquisas eleitorais. Tudo se torna ainda mais grave à medida que vemos a eleição se aproximando sem que haja nenhuma reação por parte da sociedade. Parece que estamos fadados a, pelo menos, mais quatro anos de corrupção e imoralidade, graças ao partido da ética.

Partido esse, de acordo com seus próprios membros, que não fez nada que não tenha sido feito antes. Partido que afastou a ética da vida pública, que transformou todo político em bandido e as urnas em instrumento último de absolvição. E o pior, nesse processo, pareceu acabar com o pouco de esperança, e inteligência, que ainda restava ao eleitor brasileiro.

Digo isso porque nessa eleição espera-se haver o maior índice de votos nulos da história de nossa democracia, a maioria oriunda de eleitores da classe média para cima. O eleitor, cansado de eleger corruptos, resolve anular seu voto, afastar-se da política e “lavar as mãos”. Tudo começou com uma interpretação errônea, de acordo com o TSE, da lei eleitoral. Parcela significativa da população acreditava que se houvesse mais da metade de votos nulos, a eleição seria cancelada e novas seriam marcadas. Achavam que desse modo estariam mandando um recado claro à classe política, mostrando sua insatisfação.

Bom, mesmo que houvesse essa possibilidade, dificilmente o número de votos nulos chegaria ao volume necessário para o cancelamento do pleito. Além disso, creio tratar-se do tipo de mensagem desnecessária. Nem mesmo o mais corrupto dos políticos brasileiros tem a cara de pau de achar que o povo está satisfeito com sua classe. Ademais, se o povo brasileiro possuísse tamanha capacidade de mobilização, esse protesto não seria necessário, pois a maioria dos políticos corruptos já teria perdido seus cargos devido à pressão popular.

Mesmo assim, após a queda do mito, ainda existem aqueles que defendem o voto nulo. Voto de protesto, eles dizem. Escondem-se sob o véu do auto-engano, achando que ao não votar, não estarão contribuindo para a corrupção. Ledo engano. O voto nulo é a maior arma dos corruptos. E o que lhes dá a força para continuar no poder. As razões, explico a seguir.

Como já foi dito nesse blog, parcela grande da população está sendo beneficiada pelo programa de redistribuição de votos, quer dizer, renda do governo. Essa parcela é justamente aquela sem tanta consciência política e mais imediatista, suscetível às armadilhas do populismo barato e assistencialista. Assim, a obrigação de analisar a situação com clareza e lutar para que ela mude sobra para aqueles que tem condição de fazê-lo. Ao anular o voto, uma pessoa está tornando-se cúmplice de tudo que está ocorrendo, está mostrando indiferença quanto à situação absurda em que nosso país se encontra, mantendo no poder um partido moralmente falido, que tem em suas linhas toda espécie de criminosos e bandidos e cujo candidato à reeleição já declarou ser contra o congresso, instituição máxima da democracia.

É preciso que as elites brasileiras deixem de lado a ingenuidade do voto nulo e assumam seu papel, que é ditar os rumos da nação, mostrar o que é certo e o que é errado. Anulando o voto, seja sob o pretexto da não existência de candidatos ideais, ou pela vontade de se passar uma mensagem, o eleitor está na verdade contribuindo para que o lamaçal e a corrupção continuem existindo em nosso país.

É necessário que as pessoas entendam de uma vez por todas que o processo democrático é lento e gradual, muitas vezes ineficiente. O povo brasileiro sempre possuiu uma tendência muito forte a atribuir um caráter messiânico aos seus governantes. Sempre achou que cedo ou tarde surgirá um político inteligente, integro e capaz. Que tirará uma fórmula mágica da cartola e realizará todas mudanças necessárias para salvar o país. É por isso que o desapontamento gerado por políticos corruptos torna-se descrença no país e em suas instituições. É por isso que muitas pessoas decidem anular seus votos.

Acredito que o fim das crenças messiânicas seja parte do amadurecimento político de qualquer sociedade. O que não pode ocorrer é a adoção da alienação como solução dos problemas. Não devemos nos omitir da escolha de nossos governantes, ainda mais em situações como a atual. Devemos, dentro de nossa capacidade de discernimento, escolher aqueles candidatos que se mostram mais adequados a ocupar os cargos públicos, mesmo que não sejam os ditos candidatos “ideais”. Um país é construído passo a passo e apesar de não existir nenhum candidato capaz de dar um longo passo à frente, existem aqueles que certamente farão melhor do que dar passos para trás, como tem acontecido.

segunda-feira, setembro 18, 2006

O PT e a Revolução Cultural

No último ano e meio o Brasil viu aquele partido que trazia para si a condição de partido ético, o PT, perder sua condição de partido de moral ilibada com sucessivos escândalos. Nas duas últimas semanas, mais acusações surgiram. A despeito de todos estes fatos, o atual presidente continua favorito nas pesquisas de intenção de voto. Por mais que a vantagem eleitoral de Lula seja explicada pela “compra de votos” do bolsa família como se demonstrou neste blog, isso não explica como Lula ainda possui votos em classes esclarecidas e como foi eleito pela primeira vez. Se se soma a isso outro fato já reportado aqui: o caráter totalitário do PT e o fato de que as relações desse partido com o pior e o mais desonesto da política, guerrilheiros, criminosos (MIR), ditadores (Fidel Castro), forças paramilitares (FARC); para são de longa data, resta saber como a população brasileira se dispôs a tolerar tal situação.

A resposta mais simples está na seguinte expressão: revolução cultural, uma típica estratégia da esquerda. Nos próximos parágrafos, procurarei esclarecer alguns pontos dela.

A revolução cultural consiste em impugnar na sociedade determinados ideários de forma que a transição para o regime-objetivo (o socialismo, notório exemplo) ocorra sem convulsões sociais. É uma espécie de lavagem cerebral da sociedade. Através dela, com o tempo, as idéias opostas à esquerda se marginalizarão restando apenas as da esquerda, de forma que a abolição da propriedade privada e outros aspectos da transição para o socialismo ocorram despercebidos. Explicitarei dois aspectos da revolução cultural no Brasil.

O primeiro deles, e mais patente, é a esquerdização da mídia. O grande maioria dos articulistas da mídia brasileira flertam com as idéias esquerdistas e os grandes órgãos da mídia nacional, salvas algumas raras exceções, têm um forte viés para a esquerda na seleção das pautas e na apresentação das notícias. Esse fato é fortemente demonstrado por Reinaldo Azevedo e Olavo de Carvalho, por exemplo.

O segundo fato é a esquerdização da grande maioria dos professores secundários do país. Esse fenômeno tem origem no ambiente socialista das universidades brasileiras e impactos profundos no debate político, na medida em que os filhos de elite do país são formados por meio de preconceitos e ideologias ao invés de conhecimento e teoria.

Somados esses dois fatores e diversos outros, não é de se espantar que o candidato à presidência mais à direita no espectro político seja do partido dito social-democrata. Também não é de se espantar que a população seja tão leniente com as diatribes totalitárias do PT. O problema, enfim, não teve seu início no governo Lula.

quarta-feira, setembro 13, 2006

Total de Empregos Gerados por Todos os Governos da História: Zero

Dos males que acometem os brasileiros, o desemprego é um dos mais agudos. Muitas pessoas gostariam de trabalhar, de ter a oportunidade de melhorar, pelo próprio esforço, sua condição de vida, mas não a encontram. Programas de assistência social vêm como paliativos ao sofrimento causado pela pobreza, mas mesmo seus defensores reconhecem que não resolvem o problema pela raiz: o trabalho e sua justa remuneração são essenciais para uma vida digna.

É natural, então, que todos os candidatos a cargos executivos prometam, se eleitos, gerar mais empregos, e ainda ofereçam suas obras e projetos passados, de quando ocuparam cargos públicos, como exemplos. Ilude-se quem neles acredita. Projetos e obras públicas não geram emprego algum.

Tomemos o exemplo da construção de uma ponte. Sem dúvida, muitas pessoas lá trabalham, e recebem um salário; ou seja, estão de fato empregadas. Mas de onde saem os recursos para pagar os salários dos trabalhadores dessa obra? Da cobrança de impostos. O governo só pode gastar para construir essa ponte porque confiscou parte da renda de diversos indivíduos. Cada centavo que o governo gasta para construir a ponte foi um centavo que uma pessoa não pôde gastar. Na obra pública esse dinheiro remunera vários trabalhadores; da mesma forma, se os donos originais dele tivessem podido gastá-lo, ele remuneraria vários trabalhadores. Em termos líquidos a criação de empregos da obra pública é nula.

O mesmo vale para projetos privados que o governo subsidia. A empresa subsidiada recebe um empréstimo cuja fonte são os impostos, que teriam sido usados de outra forma e mantido empregos em outras áreas caso não tivessem sido cobrados. E qual é a diferença entre essas duas diferentes alocações dos recursos? Ora, aquela que é o resultado das escolhas individuais voluntárias revela as necessidades e desejos mais urgentes que as pessoas têm, os quais procuram saciar; já aquela que é o resultado da ação governamental revela a prioridade de algum funcionário público cuja função é decidir como gastar um dinheiro que não é dele.

Por fim, lembremo-nos que a cobrança de impostos incide sobre quem produz, sobre quem tem como pagá-los. Logo, ela é uma punição à produção, e portanto constitui um desestímulo à produção, o que significa que produzir-se-á menos, diminuindo assim o total arrecadado de impostos. Em conseqüência, o governo poderá pagar menos salários do que seriam pagos nas transações voluntárias, e assim gerará menos empregos do que seriam gerados se não houvesse imposto e obra pública (ou projeto privado subsidiado).

A falta de emprego é um sério problema social de nosso país. Mas isso de forma alguma justifica a defesa de meios que não têm a menor possibilidade de corrigir ou sequer atenuar o problema, e que de fato agravam-no. O governo não tem como gerar empregos, apesar de a propaganda política afirmar o contrário, por ignorância ou má fé. O que um governante pode fazer para gerar empregos é tirar o governo definitivamente do mercado de trabalho (é a legislação trabalhista a real culpada pelo desemprego), e diminuir radicalmente o volume de gastos públicos.

terça-feira, setembro 05, 2006

Bolsa Família, uma fraude eleitoral

Havia tempo não se via uma eleição tão fácil para o partido da situação. Embora tenha começado a esboçar uma reação, o principal adversário do Governo encontra-se muitos pontos percentuais atrás nas pesquisas de intenção de voto, havendo inclusive forte expectativa de não ocorrer um segundo turno.

Analisando-se friamente a situação do país, vemos que não houve nenhuma melhoria significativa nesses últimos quatro anos. O pouco crescimento econômico obtido foi graças ao ambiente externo favorável, o nível de impostos continua sufocante, a situação da segurança pública continua calamitosa e o ensino e a saúde pública seguem em sua estrondosa deterioração. Além, é claro, dos diversos escândalos, que contavam com a participação direta de diversos membros do governo, que ocorreram no período.

Portanto, dito tudo isso, a pergunta que fica é: por que um governo corrupto e incompetente desses possuiu tamanha vantagem? A resposta é simples e única, compra de votos. A realidade nua e crua é que o atual governo adotou práticas dignas do coronelismo, do voto de cabresto. Uma afronta à Democracia e tudo que ela deveria representar.

Diversos são os exemplos, mas aqui focarei apenas na “menina dos olhos” do Governo Lula, o Bolsa Família. Esse programa, teoricamente, consiste em uma ajuda financeira às famílias de baixa renda que possuem crianças matriculadas na escola. A princípio, pode parecer se tratar de um programa bem intencionado, visando levar educação à parcela mais pobre da população e diminuir a desigualdade de renda, fazendo com que os pais tenham incentivos para matricular e fazer seus filhos freqüentarem a escola. Porém, como mostrarei a seguir, o programa possui falhas graves, tanto em sua parte teórica quanto prática. Essas falhas demonstrarão porque acredito se tratar de uma fraude eleitoral.

Para começar, analisemos o argumento base: “esse programa visa por comida na mesa daqueles que não tem o que comer, impedir que pessoas morram de fome”. Qualquer um que ligue o rádio ou a TV pode ouvir nosso atual Presidente dizendo de boca cheia que seu programa atende onze milhões de famílias, quase cinqüenta milhões de brasileiros. Bom, todos nós sabemos que não vivemos em um país rico. Mas daí a afirmar que 1/4 de nossa população é morta de fome existe um abismo de diferença. Se realmente se tratasse de um programa visando impedir que pessoas morressem de fome, certamente o número de beneficiados deveria ser menor, como mostram as estatísticas.

O segundo argumento mais usado é o seguinte: “a vantagem desse programa é que faz com que as crianças freqüentem a escola, e com isso garante um futuro melhor para elas”. Caso possuíssemos um sistema de ensino decente, esse argumento poderia ser usado.

Porém, ano após ano, o Brasil consegue um honroso lugar na ponta inferior da tabela de classificação em toda espécie de prova visando analisar a qualidade do ensino ao redor do mundo. Também não é raro aparecer em telejornais mães e pais reclamando que seus filhos concluíram os estudos e não sabem nem escrever e somar.

Sendo assim, qualquer um que reflita por um milésimo de segundo pode perceber o óbvio. Mesmo que esse programa faça com que mais crianças freqüentem a escola (o que as evidências apontam ser verdadeiro, mas não na proporção esperada, dado o número de beneficiários), provavelmente isso não trará benefício algum para o país, pois nosso sistema de ensino é falido, e carece de investimentos. Investimento esse que poderia estar sendo feito com os recursos destinados ao programa. Trata-se de uma questão de qualidade, e não quantidade. Seria melhor para o país ter menos crianças nas escolas públicas, mas com a certeza de que as mesmas sairiam no mesmo nível das demais, do que ter um número maior de crianças, tendo a certeza de que a maioria sairá em um nível muito baixo. Aliás, em um país, como o nosso, onde o governo já se encontra em seu limite de arrecadação, o bom uso dos recursos faz-se ainda mais fundamental.

Por fim, no que tange a melhor distribuição de renda, o programa é completamente inoperante. Trata-se de uma redistribuição artificial, que não leva a uma mudança na estrutura distributiva do país. É algo efêmero, que com o fim do programa deixará apenas malefícios. Pois se mantido por muito tempo (algo improvável, diga-se de passagem) gera incentivos para que as famílias de baixa renda tenham mais filhos, além, é claro, do desincentivo gritante ao trabalho que representa.

Existem também, evidências na aplicação do programa, que mostram com eficácia porque trata-se de uma fraude eleitoral, movido apenas pelo desejo de manter-se no poder e sem qualquer indício de benevolência por trás. Aqui, para não ser injusto, incluo também programas como o PROUNI e semelhantes. Qualquer um que entrar no Google e realizar uma busca achará milhões de notícias sobre fraudes no Bolsa Família e similares. Pessoas de renda elevada, pessoas que não tem filhos, e todo tipo de gente que teoricamente não deveria estar sendo beneficiada, recebendo dinheiro do programa. Fato, aliás, que corrobora meu primeiro argumento, sobre a quantidade de pessoas que necessita desse auxílio para sobreviver. Claramente, existe um grande número de pessoas que não necessitaria desse dinheiro o recebendo. E, provavelmente, logo após as eleições, esses programas minguarão.

Ou seja, a pressa para incluir pessoas nos programas era tamanha, que houve pouquíssima preocupação em aplicar os critérios para entrada no programa. O motivo? Muito simples: quanto mais gente recebendo o dinheiro, mais votos para o candidato do governo.