sábado, setembro 23, 2006

Voto nulo, a pior opção

Nossa democracia vive um momento delicado. Apesar dos diversos escândalos envolvendo nosso atual presidente e seu partido, não vemos nenhuma mudança nas pesquisas eleitorais. Tudo se torna ainda mais grave à medida que vemos a eleição se aproximando sem que haja nenhuma reação por parte da sociedade. Parece que estamos fadados a, pelo menos, mais quatro anos de corrupção e imoralidade, graças ao partido da ética.

Partido esse, de acordo com seus próprios membros, que não fez nada que não tenha sido feito antes. Partido que afastou a ética da vida pública, que transformou todo político em bandido e as urnas em instrumento último de absolvição. E o pior, nesse processo, pareceu acabar com o pouco de esperança, e inteligência, que ainda restava ao eleitor brasileiro.

Digo isso porque nessa eleição espera-se haver o maior índice de votos nulos da história de nossa democracia, a maioria oriunda de eleitores da classe média para cima. O eleitor, cansado de eleger corruptos, resolve anular seu voto, afastar-se da política e “lavar as mãos”. Tudo começou com uma interpretação errônea, de acordo com o TSE, da lei eleitoral. Parcela significativa da população acreditava que se houvesse mais da metade de votos nulos, a eleição seria cancelada e novas seriam marcadas. Achavam que desse modo estariam mandando um recado claro à classe política, mostrando sua insatisfação.

Bom, mesmo que houvesse essa possibilidade, dificilmente o número de votos nulos chegaria ao volume necessário para o cancelamento do pleito. Além disso, creio tratar-se do tipo de mensagem desnecessária. Nem mesmo o mais corrupto dos políticos brasileiros tem a cara de pau de achar que o povo está satisfeito com sua classe. Ademais, se o povo brasileiro possuísse tamanha capacidade de mobilização, esse protesto não seria necessário, pois a maioria dos políticos corruptos já teria perdido seus cargos devido à pressão popular.

Mesmo assim, após a queda do mito, ainda existem aqueles que defendem o voto nulo. Voto de protesto, eles dizem. Escondem-se sob o véu do auto-engano, achando que ao não votar, não estarão contribuindo para a corrupção. Ledo engano. O voto nulo é a maior arma dos corruptos. E o que lhes dá a força para continuar no poder. As razões, explico a seguir.

Como já foi dito nesse blog, parcela grande da população está sendo beneficiada pelo programa de redistribuição de votos, quer dizer, renda do governo. Essa parcela é justamente aquela sem tanta consciência política e mais imediatista, suscetível às armadilhas do populismo barato e assistencialista. Assim, a obrigação de analisar a situação com clareza e lutar para que ela mude sobra para aqueles que tem condição de fazê-lo. Ao anular o voto, uma pessoa está tornando-se cúmplice de tudo que está ocorrendo, está mostrando indiferença quanto à situação absurda em que nosso país se encontra, mantendo no poder um partido moralmente falido, que tem em suas linhas toda espécie de criminosos e bandidos e cujo candidato à reeleição já declarou ser contra o congresso, instituição máxima da democracia.

É preciso que as elites brasileiras deixem de lado a ingenuidade do voto nulo e assumam seu papel, que é ditar os rumos da nação, mostrar o que é certo e o que é errado. Anulando o voto, seja sob o pretexto da não existência de candidatos ideais, ou pela vontade de se passar uma mensagem, o eleitor está na verdade contribuindo para que o lamaçal e a corrupção continuem existindo em nosso país.

É necessário que as pessoas entendam de uma vez por todas que o processo democrático é lento e gradual, muitas vezes ineficiente. O povo brasileiro sempre possuiu uma tendência muito forte a atribuir um caráter messiânico aos seus governantes. Sempre achou que cedo ou tarde surgirá um político inteligente, integro e capaz. Que tirará uma fórmula mágica da cartola e realizará todas mudanças necessárias para salvar o país. É por isso que o desapontamento gerado por políticos corruptos torna-se descrença no país e em suas instituições. É por isso que muitas pessoas decidem anular seus votos.

Acredito que o fim das crenças messiânicas seja parte do amadurecimento político de qualquer sociedade. O que não pode ocorrer é a adoção da alienação como solução dos problemas. Não devemos nos omitir da escolha de nossos governantes, ainda mais em situações como a atual. Devemos, dentro de nossa capacidade de discernimento, escolher aqueles candidatos que se mostram mais adequados a ocupar os cargos públicos, mesmo que não sejam os ditos candidatos “ideais”. Um país é construído passo a passo e apesar de não existir nenhum candidato capaz de dar um longo passo à frente, existem aqueles que certamente farão melhor do que dar passos para trás, como tem acontecido.

4 comentários:

Luiz Felipe Amaral disse...

O argumento é ótimo, exceto por um ponto: as urnas não absolvem ninguém. Nixon deixou o cargo no meio do seu segundo mandato.

Lula pode ser reeleito, mas ainda estará passível às leis.

Werther Vervloet disse...

Concordo com você, Luiz. Só que alguem esqueceu de avisar os petralhas, visto que eles cantam aos quatro ventos que as urnas decidirão se são culpados ou inocentes. E o pior de tudo, há quem compre esse discurso.

Joel Pinheiro disse...

Concordo plenamente com o erro do voto nulo.

Não posso deixar passar essa, no entanto:
"o congresso, instituição máxima da democracia."

Se isso for verdade, e não duvido que seja, isso diz muito sobre a desejabilidade da democracia!

A democracia com sufrágio universal é de fato um processo gradual: um processo gradual na direção do socialismo.

pessoa disse...

"mantendo no poder um partido moralmente falido, que tem em suas linhas toda espécie de criminosos e bandidos"

se em seguida não tivesse falado de reeleição, eu não saberia do que estamos falando. sério.

acho que, de todas as que me lembro, essa é a eleição com as piores opções, opinião dividida por muitos conhevidos, e que passaram por muitas mais.