sexta-feira, dezembro 22, 2006

O crescimento econômico

Objeto de campanhas presidenciais e assunto sempre em pauta, o crescimento econômico é, certamente, um tema de enorme relevância. Atualmente, com grande freqüência temos ouvido falar em um pacote de medidas, a serem implantadas pelo governo, visando atingir um crescimento condizente com a capacidade brasileira.

Muita gente acha que é esse o papel do governo, promover o crescimento. Isso é um erro. Obviamente que o Estado tem um papel a cumprir, mas está longe de ser o principal player desse jogo.

Visando promover o desenvolvimento econômico, cabe ao Estado gerar condições mínimas de segurança e estabilidade, de modo que os agentes privados tenham a tranqüilidade para exercer suas atividades e a certeza de que colherão os frutos de seu trabalho. Incluo dentro dessas condições mínimas o acesso à saúde e à educação, que além de influenciar na produtividade dos trabalhadores, ajudam no fortalecimento do Estado de Direito. Fora disso, qualquer intervenção estatal na economia torna-se amplamente discutível.

Passando para uma análise mais aplicada, vejamos a atual situação do Brasil. O país, apesar de possuir uma grande capacidade de crescimento, vem observando, ano após ano, seu PIB crescer de maneira inexpressiva. Como já discuti em textos anteriores, isso se deve à falta de um ambiente de negócios propício, que gere aos investidores, internos e externos, um cenário favorável para que apliquem seu dinheiro. Faltam condições para que a poupança vire o investimento que promove o crescimento da economia. Para resolver esse problema foi criado um pacote de mudanças.

O dito pacote será benéfico em alguns itens. Mas, deixa de lado diversos fatores que são de suma importância. Primeiro, a intenção do governo é fazer com que a taxa de juros caia consistentemente, de modo que deixe de travar com outros setores da economia um duelo desleal na captação de recursos. O objetivo é aumentar a taxa de investimento da economia. A idéia é louvável, mas incorreta. É certo que a taxa de juros não poderá cair muito mais do que já caiu. Todas previsões indicam que, em 2007, haverá um excesso de demanda em relação à produção nacional. A princípio, isso não é um grande problema, visto que possuímos superávit comercial e câmbio valorizado o que permite atender a esse excesso de demanda com importações, sem grandes impactos na inflação. Porém, não sabemos até quando durará nossa boa fase comercial e a desvalorização cambial oriunda do aumento das importações representará um impulso inflacionário (tornando diversos produtos mais caros dentro do país) e um obstáculo à importação de produtos estrangeiros. Ou seja, embora o governo possa se dar ao luxo de propor grandes reduções da taxa de juros, não poderá mantê-las indefinidamente baixas. Também, não podemos ancorar um projeto de crescimento econômico em bases tão tênues como um próspero período de bonança comercial.

Pequenos pacotes como esse, estão longe de resolver o problema. São necessárias grandes reformas estruturais, para que o país possa retomar a rota do crescimento. De que adianta lançar um pacote para o crescimento se ao mesmo tempo promovem um aumento do salário mínimo, que além de aumentar os gastos públicos com o funcionalismo ainda piora a deplorável situação de nossa previdência? Nas palavras de membros do governo, parte dos reflexos positivos do pacote certamente foram anulados por esse aumento no salário mínimo.

O governo deve, de uma vez por todas, entender que a melhor coisa que pode fazer pela economia é libertá-la de suas garras. Para tanto, deve promover profundas reformas em diversas áreas, buscando sempre garantir um ambiente de negócios estável e propício, além da liberação de recursos, hoje nas mãos do governo, para o uso mais eficiente do setor privado, para que, esse sim, promova o crescimento da economia.

segunda-feira, dezembro 18, 2006

Mente: Produto do Corpo?

Existem idéias que parecem fazer sentido, que são aceitas por muitos, e que, se analisadas cuidadosamente, levam a auto-contradições e absurdos que ninguém jamais aceitaria.

Uma dessas idéias, à primeira vista perfeitamente aceitável, é a de que a mente, ou os processos mentais, sejam produto do corpo (ou, mais especificamente, do cérebro). Faz sentido, não faz? O corpo tem diversos órgãos que produzem diversas substâncias diferentes, e não há dúvida de que o cérebro está diretamente ligado aos nossos pensamentos; dada a sua enorme complexidade, pode ser que os processos que nele ocorrem (sinapses neurológicas, liberação de químicos, etc) dêem origem aos nossos pensamentos, desejos e emoções. Não há como provar definitivamente que isso seja o caso, mas é uma possibilidade, não é mesmo?

Suponhamos que essa possibilidade seja de fato aceitável, e aceitemo-la. Que conclusões se seguiriam logicamente? Bom, o pensamento é produto das condições físicas de nosso cérebro, da mesma forma que a saliva é o produto de nossa glândula salivar. As características particulares da saliva que produzimos depende dos processos que se dão na glândula salivar; duas glândulas em estados diferentes produzirão salivas de tipos diferentes (com mais ou menos enzimas, por exemplo). Da mesma forma, o pensamento que a mente terá depende das condições particulares e específicas do cérebro; se a sinapse B ocorrer ao invés da sinapse A, isso terá conseqüências no produto do cérebro, ou seja, no pensamento.

Agora imaginemos um ser humano qualquer, e digamos que ele acredite no socialismo. Usualmente, diríamos que esse sujeito é socialista porque acredita que o problema da pobreza poderia ser resolvido com o planejamento da economia, que a desigualdade social é uma injustiça, etc. Mas pela nossa suposição essas explicações são inaceitáveis; a real causa da crença socialista é o fato de que, no cérebro do rapaz, ocorrem certas sinapses e um certo químico age de certa maneira de modo que o produto de tudo isso é a ideologia em questão.

O pensamento nada mais é do que o resultado natural de uma certa condição cerebral, assim como o tipo de saliva o é da condição da glândula. Assim, não existe pensamento verdadeiro ou falso, da mesma forma que não existe saliva verdadeira ou falsa. Mesmo o que o nosso senso comum diz ser a mais absurda das crenças, digamos, que a lua é feita de queijo, é a conseqüência natural e adequada de uma certa disposição dos componentes do cérebro, nem mais nem menos correta que nenhuma outra.

Alguns apelariam a uma definição pragmática de verdade, nessas linhas: “de fato, não existe saliva verdadeira ou falsa, mas existe saliva que cumpre ou não sua função, de ajudar na digestão dos alimentos. E existem pensamentos que ajudam o homem a sobreviver e a agir no mundo, e é isso que é o pensamento verdadeiro”. Mas essa defesa é impossível, pois a própria escolha de uma finalidade é uma idéia, e o julgamento de se uma finalidade foi ou não atingida também é um ato mental, e assim, pela própria teoria materialista, apenas o produto natural do cérebro em condições X.

Logo, uma visão materialista consistente não dá espaço para a existência de verdade ou falsidade. Assim, não é possível afirmar que a própria tese materialista esteja correta, pois isso seria contrariar sua conclusão lógica. Crer que os pensamentos são determinados por condições físicas do mundo material implica afirmar a não existência de verdade, e portanto implica não crer na própria crença. Portanto, é impossível aceitar o que diz o materialismo sem cair em contradição.

terça-feira, dezembro 12, 2006

Breve introdução à Hipótese de Mercado Eficiente (HME)

O texto de hoje e o meu próximo tratarão de dois conceitos recorrentemente abordados em trabalhos de Finanças, e que, para leitores não familiarizados com a área, podem gerar confusões. Serão exploradas a noção de eficiência dos mercados e, em seguida, a definição da taxa livre de risco, buscando o esclarecimento de tais idéias.

O número de investidores ativos ou indiretos, que se envolvem com o mercado financeiro através de fundos, tem aumentado no Brasil nos últimos anos e, assim, o interesse por trabalhos que elucidem o seu funcionamento tem crescido. O jargão financeiro, contudo, pode desencorajar essa busca por conhecimento e oportunidades. Explicarei algumas noções simples, mas fundamentais para a teoria na qual esses trabalhos se baseiam, começando pela eficiência dos mercados.

A idéia de mercados eficientes é uma hipótese na qual se baseiam diversos modelos financeiros e, apesar de difícil de ser sustentada teoricamente e empiricamente ("anomalias do mercado"), é essencial para o entendimento do mercado financeiro.

Um mercado é considerado eficiente quando os preços dos ativos reproduzem plenamente a informação disponível e refletem novas informações de forma precisa e imediata. Mercados eficientes são frequentemente confundidos com mercados perfeitos, mas, ao contrário da eficiência, a perfeição implica ausência de fricções como custos de transação ou impostos.

A eficiência é fruto da racionalidade dos agentes e da competição. Os agentes, baseados num entendimento correto do processo de criação de valor, formulam suas expectativas de preços fazendo o melhor uso da informação disponível e, assim, a refletem de forma precisa nos preços. A competição garante que novas informações sejam reproduzidas imediatamente nos preços, uma vez que os participantes do mercado estão a procura de oportunidades de lucro e prontos a analisar toda essas informações.

As avaliações irracionais, por serem descorrelacionadas, se anulam e caso investidores apresentem o mesmo comportamento irracional suas influências nos preços são eliminadas pelos especuladores racionais.

Como consequência da eficiência os preços mudam apenas quando os valores intrínsecos mudam, quando algum acontecimento altera a previsão do valor presente dos fluxos de caixa futuros. Deste modo, as variações de preços são aleatórias, pois o fluxo de informações é aleatório.

Contudo, como os investidores desviam da racionalidade (moda, etc.) e a competição nem sempre é plena, diversos níveis de eficiência são observados nos mercados. Assim, é possível que, por exemplo, análises fundamentalistas (que utilizam dados econômicos e contábeis) e até análises técnicas (dados de mercado) tenham alguma capacidade de prever preços futuros.

sábado, dezembro 09, 2006

Comparação Espúria

“But to make the comparison applicable, we must compare Communism at its best, with the régime of individual property, not as it is, but as it might be made. The principle of private property has never yet had a fair trial any country; and less so, perhaps, in this country.”
(Mill, John Stuart. Principles of Political Economy,
Book II. Distribution, Chapter I: Of Property)



Discussões acerca da melhor forma de se organizar economicamente uma sociedade não são fáceis. Mesmo que se concorde com alguns fatos objetivos, pode-se não concordar com a desejabilidade desses fatos. Por mais que seja razoavelmente seguro afirmar que a economia de mercado seja superior a qualquer outra forma de organização econômica já experimentada quanto à capacidade de prover materialmente a sociedade, ainda assim é possível acreditar ser injusta propriedade privada (premissa desse tipo de organização). Dentro dessa discussão há, contudo, um argumento inadmissível: a distinção entre o socialismo teórico e o real, ou, a comparação entre o “capitalismo” e o socialismo teórico.

O argumento tem duas formas possíveis. Pela primeira, se compara o socialismo (e, especialmente o comunismo) por aquilo que “prevêem” os livros com o “capitalismo” ou a economia de mercado que de fato ocorre, pelo menos em alguma medida. Pela segunda forma, argumenta-se que a comparação entre essa sociedade de economia de mercado e os regimes socialistas que ocorreram na história não é adequada, pois tais regimes socialistas não representam de fato aquilo que o socialismo é.

Obviamente, deve existir congruência nas comparações. Não se pode comparar uma teoria com os resultados práticos de outra teoria e vice-e-versa. Não faz sentido, por exemplo, comparar as hipóteses de um modelo microeconômico com os resultados da aplicação prática de um modelo macroeconômico. Da mesma modo, não faz sentido argumentar a superioridade do socialismo em teoria em relação ao que, aparentemente, são as “mazelas do capitalismo”.

Ademais, existem motivos para manter uma discussão desse tipo no nível dos resultados práticos, apenas. Afinal, o propósito do debate é estabelecer a melhor forma de organização prática da sociedade e não qual sociedade é preferível do ponto de vista teórico. São irrelevantes as vantagens do socialismo se sua aplicação não pode ser obtida ou se qualquer tentativa dessa aplicação esbarre em um número altíssimo de mortes, algo que muitos argumentam como implicação necessária da implantação do socialismo. Dentro desse contexto, o contraste deve necessariamente ocorrer entre aquilo que o socialismo entregou de fato à humanidade com aquilo que a economia de mercado entregou de fato à ela.

Não se deixe enganar, caro leitor.

segunda-feira, dezembro 04, 2006

Por um ganho de competitividade

Já é fato corriqueiro ver o Brasil nas últimas colocações de rankings mundiais. Educação, saúde, violência, corrupção ou crescimento econômico, não importa. Estamos sempre lá, ocupando “honrosas” posições no fim da lista.

Dessa vez, não foi diferente. Em estudo analisando a competitividade dos BRIC’s, as economias emergentes que apresentam maior potencial de desenvolvimento, ficamos, mais uma vez, na última colocação (veja aqui). O ranking analisa diversos aspectos das economias em questão, divididos em três grandes grupos: custo e disponibilidade de capital, custo fiscal e institucional e custo operacional. Em suma, o estudo analisa o ambiente de investimentos no país de uma maneira ampla.

Passemos brevemente por cada um dos grupos acima. Primeiro vem o custo e disponibilidade do capital. É consenso que o combustível do crescimento econômico é a poupança. É uma escolha intertemporal que qualquer sociedade deve fazer, “poupar agora para consumir mais depois”. O que é poupado hoje possibilita investimentos visando o aumento da capacidade produtiva de amanhã. Sendo assim, para que um país cresça consistentemente, é necessário que tenha acesso à poupança que financie sua expansão produtiva. É disso que trata o primeiro grupo, a quantidade e o preço, na forma da taxa de juros, da poupança disponível na economia.

Na atual situação, a maior parte da poupança interna brasileira tem sido destinada a financiar os déficits governamentais. Não sendo isso o bastante, também é prática comum recorrermos à poupança externa para esse fim. O grande problema é que quão mais deficitário é um governo, maiores são as taxas de juros que deve oferecer para angariar a quantidade de recursos necessários para fechar seu orçamento.
Com isso, caso uma empresa resolva expandir suas operações e, para tanto, necessite de financiamento, terá de concorrer com a taxa de juros paga pelo governo. Se ele é adepto da frouxidão fiscal e, portanto, muito deficitário, paga altas taxas de juros. A essa taxa elevada, a maioria dos investimentos torna-se impeditiva, gerando um entrave ao crescimento econômico. Há o desvio de capital do setor privado, onde certamente teria melhor uso, para o público com toda sua ineficiência. Com isso, pode-se entender porque reinam os juros altos e a falta de capital destinada a financiar projetos produtivos.

Já no segundo grupo, temos a questão da tributação, que pode representar um entrave ao surgimento e bom desempenho de empresas, dificultando sua expansão e tornando suas operações menos lucrativas. Além disso, esse grupo engloba também o ambiente institucional de um país. São exemplos de fatores importantes nesse ambiente a segurança jurídica, nível de corrupção, trâmite burocrático, leis trabalhistas entre outros. Um conjunto composto por altos impostos, pouca segurança jurídica, leis trabalhistas mal formuladas, altos índices de corrupção e entraves burocráticos ao funcionamento da economia colocam o Brasil, mais uma vez, distante do desejado.

Por fim, o último grupo, é referente a custos diretamente operacionais como custo e produtividade da mão-de-obra, custos de logística e transporte, matriz energética, insumos e etc. Mais um grupo de fatores que afeta em grande medida o desempenho da economia onde nosso país deixa a desejar.

A situação do Brasil nos três grupos acima, além de se colocar como um entrave ao bom aproveitamento dos recursos nacionais, ainda representa um forte fator negativo a entrada de recursos estrangeiros no país. Pois, por aumentarem os riscos envolvendo investimentos no país, fazem com que seja exigido maior retorno por parte dos agentes, restringindo muito a gama de projetos que recebem esse tipo investimento.

A vergonhosa posição do Brasil no ranking mostra uma verdade irrefutável. Embora muitos argumentem que o problema do país é o excesso de práticas neoliberais no passado recente, a verdade vai justamente no sentido oposto. O grande problema do Brasil é, e sempre foi, a falta de um ambiente que promova de maneira eficiente o funcionamento do livre-mercado. Em um misto de ignorância com vontade de se perpetuar no poder, as lideranças políticas brasileiras caíram em sua própria arapuca populista. Já não sabem mais sua função dentro do país, e vivem às custas de uma utopia redistributiva, se afastando cada vez mais do que realmente melhoraria a vida de todos. Afinal, do que adianta melhorar a distribuição de renda, se o que se está distribuindo é a pobreza?