terça-feira, novembro 20, 2007

Sobre o Racismo

Dia da consciência negra! Dia de combater o racismo; uma nobre causa. Já está nas livrarias o novo livro de Antônio Risério sobre a questão racial no Brasil, que apresenta uma visão original sobre o tema. Finalmente uma voz de peso e autoridade contra o movimento negro militante que espera combater racismo com mais racismo.

Também eu vou falar sobre o racismo; mas nada de cotas neste blog. Se já sou contra leis que proíbam empresas de discriminar por cor na hora de contratar, o que dizer de leis que ditem a cor a ser contratada? É o debate mais amplo do racismo que me interessa; mesmo porque acho que ele está, ironicamente, repleto de preconceitos.

Há algo, chamado “racismo”, que todos, inclusive eu, concordam ser condenável. Uma definição dele que considero muito boa é “ódio racial”; racismo é odiar (isto é, querer o mal de) alguém por sua cor de pele, tipo de cabelo, formato dos olhos, etc, ou então por traços culturais de sua etnia. É algo desprezível deixar que um traço totalmente acidental da pessoa, que em nada muda sua essência humana, nos faça tratá-la de forma sub-humana. E não há dúvida de que isso exista no Brasil de várias formas, embora eu, branco, não o sinta na pele.

Contudo, o termo “racismo” é usado de forma muito mais abrangente, o que é prejudicial na luta contra ele. Qualquer afirmação que faça referência à cor de pele já é suspeita de racismo. Afirmar que as diferentes raças (ou sub-raças, ou o nome que se preferir) possam ter diferenças de aptidão é proibido. Apontar diferenças de comportamento é também muito mal-recebido. A situação é tal que um branco já não pode sequer se referir a alguém como negro sem criar um certo constrangimento.

Uma coisa é ódio racial; outra, é atribuição de diferenças. Essa pode ser conseqüência daquele; é o caso, por exemplo, de alguém que, por nutrir ódio contra uma raça, apóie pesquisas que mostrem essa raça como menos inteligente. Mas nem todos são assim; uma pessoa pode legitimamente crer que uma raça seja menos inteligente (crença que pode ser verdadeira ou falsa) sem por isso ser culpada de racismo (ódio racial). O mesmo vale para juízos muito mais prosaicos: ao se ver um jovem japonês, crer que ele é dos melhores alunos da sala. Claro que a crença pode estar certa ou errada com relação ao indivíduo em questão; mas em geral os japoneses são de fato bons alunos, e portanto o juízo discriminatório tem razão de ser. E quem apostaria no branco numa luta de boxe?

Que isso não leve ninguém a fazer juízos sérios sobre o caráter de outro com base apenas em freqüências estatísticas. Mas quando nada sabemos ou podemos saber sobre o indivíduo, ignorar a experiência passada e acumulada é simplesmente tolo.

Outra coisa que não é racismo é considerar mais bonitas pessoas dessa ou daquela raça. Não há nada de errado com o fato de uma pessoa preferir aquelas com cuja aparência e jeito de ser já está mais habituado pelo convívio; pelo contrário, é perfeitamente normal, e não motivo de vergonha ou que exija mil explicações. E são dessas percepções de diferença que surge o humor, uma das formas que os homens conhecem de lidar com o que é diferente e torná-lo familiar. Embora possa ser excessivo ou mal-utilizado, não é, em si, condenável; e se a luta contra o racismo nos obriga a obliterar o senso de humor, há algo de errado nessa concepção de racismo.

Grande parte da luta do movimento anti-racista, cuja motivação inicial é boa, é gasta com iniciativas tolas: impedir que se discrimine o que é de fato diferente. Pois é claro que existem diversas diferenças entre as raças: jeito de ser, temperamentos, aptidões físicas e intelectuais, etc. Ao se impedir que elas sejam publicamente expressas, sem constrangimento e sem ódio, mata-se as possibilidades de convivência harmônica. Sem abertura, liberdade e senso de humor não se acabará com o verdadeiro racismo; antes, ele aumentará, escondido por detrás de relações cada vez mais rígidas e de divisões cada vez mais profundas.

domingo, novembro 11, 2007

Ron Paul: esperança para a política americana; e para a brasileira?

Odeio política. Dão-me raiva a ignorância e as mentiras dos candidatos, e indignação a igualdade das propostas. Toda eleição é a mesma farsa: ter que escolher, dentre poucos e péssimos, aquele que parece ser o menos nocivo ao país. Neste ano, no entanto, a política americana tem me entusiasmado; e isso por um motivo apenas: Ron Paul, do partido Republicano.

Ron Paul é o único candidato que defende o Estado mínimo: rejeita tanto as intervenções estatais internas (assistencialismo) quanto externas (guerras). Se eleito, entre outras coisas, reduzirá drasticamente a carga tributária, eliminará o imposto de renda, abolirá o Banco Central (volta ao padrão-ouro) e retirará as tropas do Iraque. É defensor do direito à posse de armas e contrário ao aborto.

Ao mesmo tempo, é o único que, em sua trajetória política, demonstrou ser um homem de princípios. Em sua carreira de congressista, sempre votou conforme seus ideais, contra qualquer proposta que não encontrasse respaldo explícito na Constituição americana, o que lhe rendeu o apelido de “Dr. No”. Não muda suas posições conforme o vento, diferentemente da grande maioria de ambos os partidos.

Sem dúvida, é um candidato radical; e por isso mesmo entusiasma. Vence todas as pesquisas online. Seus próprios eleitores fazem, voluntária e extra-oficialmente, a maior parte de sua campanha. Tem sido recordista em angariar fundos (dia 05/11, sua campanha recebeu US$ 4 milhões em doação, tudo de apoiadores autônomos). É ainda pouco conhecido, e por isso vai mal nas pesquisas convencionais por telefone, mas quem o conhece costuma gostar dele; e quem o apóia, o faz por convicção, e não para evitar o mal maior.

Por isso, a grande mídia estabelecida tem feito o possível para ignorá-lo. Evitam falar sobre ele ou dar-lhe qualquer tempo de exposição. Acusam seus eleitores de “melar” pesquisas online, “straw polls”, encontros políticos, etc. Enfim, seria tudo uma agitação de uns poucos extremistas que não mereceria atenção. Mesmo a The Economist, revista supostamente liberal, tem se calado. Quando falou de Ron Paul, foi para dar o exemplo de um sonhador tolo mas inspirador, cujo módico e inesperado sucesso aponta para um idealismo que outros candidatos deveriam emular. Já em um “leader” de 20/10, de subtítulo “American conservatives need to rediscover the charm of the small government”, nem uma palavra. Falam das “propostas promissoras”, “market-oriented”, de Giuliani e McCain para reformar a saúde; de Ron Paul, o único verdadeiro conservador e defensor do Estado mínimo e do mercado, nada.

Mas os fatos já estão grandes demais para serem ignorados. US$ 4 milhões em um dia, sem qualquer organização por parte da campanha oficial, é inédito; agora não são meros votos em simulações, mas dinheiro real. E dinheiro fala alto.

Mesmo contra toda a pressão ideológica e todos os interesses poderosos contrários à sua candidatura, Ron Paul tem tido desempenho surpreendente; grupos de apoio têm sido criados não só nos EUA, mas no mundo todo (até no Brasil). Sua vitória, embora improvável, é perfeitamente possível; será mais difícil conseguir a nomeação Republicana do que vencer os Democratas. Com efeito, diz-se que ele é o único Republicano com chances de vencer Hillary.

Mas por mais que a política americana nos anime, ela nos afeta apenas indiretamente. Estado mínimo, incentivo aos poupadores e empreendedores (os motores do crescimento), fim das tarifas e regulamentações, embora muito bons para os EUA, são ainda mais necessários aqui no Brasil, que é um país pobre. Quando surgirá um Ron Paul brasileiro? E, se tal pessoa existisse, conseguiria algum apoio? Como mudar nossa situação institucional, na qual pobreza, ignorância e dissimulação garantem que os piores permaneçam no poder?

quinta-feira, novembro 01, 2007

Pirataria: Crime ou Utilidade Pública?

Se as gravadoras acham que conseguirão impedir a pirataria e a cópia de música pela Internet, podem perder as esperanças. Também duvido que as campanhas de ética terão muito efeito. Para começar, usam argumentos furados. “A produção de um CD oficial utiliza seis trabalhadores; a do CD pirata só um” (isso foi veiculado numa propaganda anti-pirataria na TV há um tempo atrás). Se isso é verdade, é motivo para comprar CD pirata: é uma indústria mais eficiente, que libera mão-de-obra para trabalhar em outros setores da economia, satisfazendo demandas da população que antes não eram satisfeitas; a sociedade enriquece.

“Ao comprar CD pirata, você financia a prostituição, as drogas, o terrorismo internacional e, de quebra, um traficante seqüestra e mata um jovem da classe média”. Ao se comprar CD pirata, financia-se o tráfico de CDs piratas. Não outros negócios. Alguém poderia dizer que o vendedor vai usar o dinheiro conseguido com o CD para fazer outras coisas. Mas nesse caso a mesma objeção vale para todas as atividades. Se o seu médico usa seu dinheiro para comprar drogas, então você, ao se consultar com ele, financia o tráfico de drogas. A não ser em casos em que haja algum tipo de proximidade pessoal e o consumidor saiba o que o produtor faz com o dinheiro, não há como responsabilizar o consumidor.

É claro que as gravadoras usarão todos os meios disponíveis para reservar para si o mercado da música, inclusive influenciar a legislação e construir argumentos espúrios para desqualificar moralmente a concorrência. Que isso não nos iluda fazendo crer que a razão realmente esteja com elas.

Não nego que haja um problema moral com a venda de CDs piratas. Afinal, parece injusto que um vendedor lucre com o trabalho de uma artista, que não recebe nada. Ele tem que ser, de alguma forma, pago. Mas e a gravadora? Qual a função dela agora?

Antes do file-sharing e dos CDs graváveis, a gravadora tinha um papel fundamental: produzir as cópias dos discos de seus artistas e vendê-las. Agora, qualquer um faz uma cópia a custo baixíssimo. Por que um artista não poderia negociar diretamente com um estúdio de gravação, gravar seu material e a produção dos CDs físicos fica a cargo de milhares de produtores e usuários?

A máquina de Xerox, ao contrário do que se temia, não destruiu o mercado editorial. O produto do Xerox é muito inferior ao livro comprado na loja, e, portanto, as editoras ainda desempenham a função importante; não precisam, por ora, temer que a demanda por seu produto acabe. Já o produto das gravadoras em pouco se diferencia do CD pirata; e é muito mais caro. Eu nunca comprei CD pirata, e ainda compro oficiais; prefiro uma caixa direita, com encarte, foto nítida, CD de qualidade. Mas a grande maioria das pessoas não liga para esses detalhes; o que as gravadoras têm a lhes oferecer? Aparentemente nada, ao menos não ao preço que cobram hoje em dia; se assim não fosse, não precisariam da lei para proteger seu negócio.

Ou encontram algum serviço de qualidade que possam oferecer aos consumidores, ou saem do mercado. É inadmissível que sustentemos essas mega-empresas apenas porque a lei nos obriga, e que elas tenham demanda apenas por possuir o monopólio legal, por décadas (unidade de tempo que, com a tecnologia atual, é totalmente descabida), dessa ou daquela música.

Em todo caso, com lei ou sem lei, já não há mais volta. A cópia de música é uma realidade e vai apenas crescer. Resta a nós elaborar leis que se adeqüem a isso (e não tentar forçar a estrutura produtiva a se adequar a leis anacrônicas) e que permitam, se é que isso será um problema, que artistas sejam remunerados por seu trabalho.