segunda-feira, junho 05, 2006

Igualdade de Oportunidades: Perigosa Ilusão

Igualdade! Haverá ideal mais aclamado em nosso tempo? Todos os partidos políticos que concorrem às eleições deste ano, por mais que briguem entre si, estão de pleno acordo que uma das metas de qualquer governo deve ser “promover a igualdade”. Seja a velha igualdade estrita do socialismo, seja a nova, moderna e democrática “igualdade de oportunidades”. Essa última é, inclusive, proposta por defensores do livre mercado, que a consideram benéfica e justa. No entanto, como tentarei mostrar, ela não passa de um engodo pernicioso e altamente destrutivo à civilização; é a velha e odiosa igualdade socialista, com aparência mais palatável e menos odor de tirania, mas em essência inalterada.

Segundo o princípio da “igualdade de oportunidades”, todas as variáveis relevantes para o desenvolvimento e progresso individual que fogem ao controle do indivíduo deveriam ser iguais para todos. Por que uns nascem ricos e outros pobres? Por que alguns nascem doentes e outros saudáveis? Ninguém tem qualquer culpa ou mérito por essas condições iniciais, e portanto não seria justo que elas fossem mais benéficas para uns e menos para outros. Seria dever do Estado, portanto, equalizar as condições iniciais de todos para corrigir essa injustiça. Assim, o resultado que cada um alcançasse (seu sucesso naquilo a que dedica sua vida) dependeria exclusivamente de seu próprio esforço.

O perigo desse ideal fica evidente em sua aplicação prática: de todas as desigualdades que se verificam entre os homens, haveria alguma mais fundamental que as diferenças entre famílias? Os filhos de pais ausentes e desinteressados têm condições iniciais muito mais desfavoráveis do que aqueles cujos pais sempre lhes deram carinho e atenção. E ninguém é culpado pelos pais que tem. O único meio de se “curar” essa desigualdade é anular o efeito da família na educação; é tornar pai, mãe e avós figuras supérfluas na formação dos indivíduos; é substituir a família pela escola, onde todos são tratados igualmente. E é claro que as desigualdades não param por aí. Sabe-se que as pessoas nascem diferentes, com diferentes aptidões; enquanto uns são potenciais gênios da matemática ou das artes, outros não têm qualquer talento inato. Novamente, a reengenharia social proposta para essas “injustiças” teria que solucionar esse problema, reprimindo e desencorajando o talento e a excelência em prol da mediocridade.

Não nos deixemos enganar: é impossível nivelar todo mundo por cima; é impossível dar a todos pais ideais e talentos inatos; o que é possível é puxar para baixo, forçando todos a uma existência pobre e homogênea. E mesmo para alcançar esse lamentável fim, que alguns julgam justo, seria preciso um dispêndio de recursos e uma violação dos direitos naturais do homem sem precedentes. Ao se tirar de quem tem para dar a quem não tem, destrói-se tanto a iniciativa a produzir de quem é extorquido como o incentivo ao trabalho de quem recebe de graça o que não merece. A sociedade humana não é capaz de sobreviver sob um regime de redistribuição tão maciço como seria necessário para igualar as oportunidades. A erradicação das oportunidades desiguais daria a todos, igualmente, oportunidade nenhuma.

É óbvio que há algo de errado com um ideal tão impraticável e cuja perseguição é letal à humanidade. O erro está em crer que a igualdade seja justa e desejável. A natureza é ela mesma desigual e trata desigualmente a cada ser humano, que por sua vez é único, e nada pode mudar isso. A desigualdade entre os indivíduos é um bem. É claro que, idealmente, todos os homens teriam um mínimo para uma boa vida (e muito do que hoje considera-se mínimo era, no passado, luxo), mas mesmo esse razoável ideal se torna nocivo se perseguido por meio da redistribuição forçada; e ele em nada exige que se busque uma igualdade entre quem tem menos e quem tem mais. Rebelar-se contra a própria natureza, contra a própria estrutura da realidade, longe de ser um ato nobre, é um perigoso e irresponsável delírio.

11 comentários:

Joel Pinheiro disse...

Para ajudar as comunidades mais pobres o que precisamos é ter direitos de propriedade bem definidos e protegidos e eliminar a legislação trabalhista, que mantém trabalhadores de baixa produtividade (pobres, jovens, idosos, etc) fora do mercado de trabalho formal.
Também é necessário diminuir os impostos para que a pouca renda deles não lhes seja confiscada ao comprarem seus bens.
Assim sim eles vão ter condições de sair da pobreza.

Tirar dinheiro de um para dar para outro não resolve nada. Quiçá até piora.

Anônimo disse...

Tema polêmico... Discordo apenas com duas colocações que fez: que a igualdade de oportunidade defendida por muitos inibiria a importância e papel família para que todos tivessem uma mesma base neste quesito e que ela reprimiria os dons e aptidões para o mesmo fim. A meu ver, tal nivelação ocorreria gradualmente, pricipalmente através de fores programas de educação, taxações sobre fortunas (heranças) e etc... Se o papel da família deixasse um gap entre o nível de oportunidades de uma pessoa e um certo nível mínimo necessário para que o sucesso desta baseie-se basicamente em seu esforço, então seria papel do governo preencher tal lacuna. A correção é para cima e não para baixo. E uma vez que a sociedade começasse a se mover mais equilibrada, as famílias, provavelmente, teriam melhores condições para colaborar com a formação de seus membros (e o gap, que deveria ser preenchido, diminuiria). E também não vejo sentido na parte da repreensão de aptidões... Dado que todos estejam partindo de, pelo menos, um nível básico (e de qualidade) educacional, o seu próprio suor e seus "dons" naturais difinirão seu sucesso.

Joel Pinheiro disse...

Brunno, quem defende a igualdade acha injusto que uns tenham mais e outros menos. Vai sim querer nivelar todos por baixo.

Os fatos provam o que eu falo. O que nosso sistema educacional atual faz, senão tentar formar homens sem a atuação dos pais? Quantos pais não deixam os filhos na escola e não querem nem mais saber deles?
Quantos não ficam bravos com a escola se seus filhos estão mal-criados?
A situação real está um passo atrás da que eu descrevi, mas segue nessa direção.

E as escolas, quantas não passam a mentira de que todos são iguais? Tem muita escola que se nega a rankear alunos, para não "estimular a competição". O que se quer é a mesma mediocridade impensante de todo mundo.

Também já há muitos que enxergam a herança como um mal, pois desiguala as oportunidades...
E patriotismo, então? Ter orgulho do próprio país já é quase crime.

Anônimo disse...

Oi Jow!
Primeiro, vou deixar registrado aqui o que já te falei. Seu artigo está muito bom. Na verdade, está tão bem escrito e fundamentado que meu primeiro ímpeto, ao qual pretendo dar vazão,foi querer divulgar o blog para os meus colegas do direito que certamente discordam muuuito de você!

Em segundo lugar, digo que apesar de concordar com muita coisa que você disse, acho que, em qualquer sociedade, um mínimo de nivelamento é necessário, nem que seja para a simples aplicação das leis.

A própria existência de um ordenamento jurídico (e, logo, de uma sociedade minimamente organizada) fica prejudicada sem se pressupor igualdade de tratamento a todos os indivíduos.

Bom, é isso.

beijos para você e parabéns a todos pelo blog!

Joel Pinheiro disse...

Concordo Gabi.
A lei deve tratar a todos de forma essencialmente igual.
Embora, por exemplo, alguns crimes possam variar de gravidade dependendo de contra quem são cometidos.

Anônimo disse...

Olá!

Joel, parabéns pelo texto. Está muito bom.

Concordo com a Gabi, muitas "pessoas jurídicas" discordarão de suas colocações. Não é o meu caso. Na verdade o que você coloca como igualdade de oportunidades era o que eu, de certa forma, encarava como igualdade de resultados, o que eu repudio (e as duas coisas, em ultima medida, se confundem um pouco mesmo).

De todo modo, e continuo concordando com a Gabi, a igualdade é necessária no estado democrático de direito, em que aliás, ela é princípio positivado.

Vale lembrar também a noção aristotélica de igualdade (se não me engano, você pode confirmar, já que é o filósofo :)) em que igualdade é tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais na medida em que se desigualam.

Joel Pinheiro disse...

Não saberia te dizer isso com certeza, Ana. Sei que para Aristóteles deve-se manter a proporção no tratamento das pessoas. Mais para o mais, menos para o menos.

E acabo de me lembrar de outra aplicação nefasta do princípio de igualdade de oportunidades: as cotas das faculdades, para membros dessa ou aquela classe.

Anônimo disse...

Isso mesmo! As cotas são um absurdo. Mas são outro exemplo de que eu falava de como as coisas se confundem. Elas - cotas - podem ser encaradas também como igualdade de resultados. Os "protegidos", discriminados(pq é isso que são)têm assegurado um resultado - vaga em ensino superior - sem merecimento próprio e sem que tenha havido oportunidades iguais numa etapa anterior.

Mudando de assunto: revoltada por mais um ato dos terroristas do MST acontecido hoje, deixo aqui a sugestão de que alguém escreva sobre isso no futuro. E, de preferência, prescreva uma fórmula ideal de extinguir os idiotas.

Werther Vervloet disse...

Joel, concordo com grande parte de seu texto e o achei muito bom. Porém, gostaria de fazer um adendo.

Levada ao limite, essa história de igualdade de oportunidades é realmente algo nefasto. Todavia, se aplicada de maneira parcimoniosa, acho que possa trazer algum bem para a sociedade, de maneira geral.

Não acho que o Estado deva interferir em "todas as variáveis relevantes para o desenvolvimento e progresso individual que fogem ao controle do indivíduo".

Mas, acredito que o Estado deva garantir à todos educação básica de qualidade, por exemplo. Por mais que a cobrança de impostos venha a gerar algumas distorções, é inegável que uma sociedade com um nível de educação mais elevado é mais produtiva, tudo mais constante. E, talvez, esse ganho de produtividade compense as distorções geradas por um nivelamento "forçado". Talvez a quantidade de mentes brilhantes perdidas, caso não recebam uma educação básica de qualidade, represente um peso morto maior do que o gerado pela tributação.

Joel Pinheiro disse...

Governo provendo educação de qualidade? Como estudante de lógica não posso deixar de ficar perplexo.

Heh, brincadeira.
Mas como todo serviço, a provisão que o governo faz dele é bastante ruim e inferior a uma provisão que ocorra sem coerção e com propriedade privada.

Só a desregulamentação do sistema de ensino que permita a real iniciativa privada pode realmente elevar a educação das pessoas.

Tudo o que o governo tem ensinado é como todo mundo é igual e como o governo é bom. Fora que, sendo de graça, sempre falta espaço (ou gasta-se demais à toa).

Isso sem falar que escola de graça para todo mundo sem qualquer responsabilidade dos pais é mais um incentivo para minar a importância da família, que julga que seu filho está sendo educado fora de casa. Tudo isso, é claro, às custas do que foi tirado dos outros.

Suponha que você tenha um filho e queira educá-lo, nas não tem o dinheiro para fazê-lo. Acharia certo pegar uma arma e extorquir o dinheiro necessário dos seus vizinhos e com ele pagar a matrícula?

Werther Vervloet disse...

Pois é, Joel, acredito que o problema da ineficiência estatal pode ser amenizado, como você mesmo disse, abrindo espaço para o setor privado. O Estado apenas pagaria a mensalidade para aqueles que não tem condições de pagá-la, deixando a prestação do serviço a cargo de instituições privadas.

Já no resto, não entendo como o fato da escola ser de graça causaria um afastamento da família. Acho que não existe uma relação causal tão forte assim.

E para finalizar, o ponto por você citado no último parágrafo é o grande X da questão. Sinceramente, está aquém das minhas capacidades propor uma solução final para esse problema. Sinceramente, acho que os benefícios oriundos de algo do gênero compensariam a tributação.

Assim como acho que, idealmente, os tributos pagos ao Estado para que esse garanta a segurança pública, a aplicação das leis e etc, são justificáveis.