segunda-feira, julho 03, 2006

Uma breve história do livre-comércio no século XIX

Seguindo o tema do último post, relatarei aqui um período do século XIX (mais precisamente entre 1860 e 1873) em que a Europa se aproximou, de forma talvez nunca antes ocorrida, do ideal do livre-comércio. O objetivo é iluminar alguns pontos sobre o comércio internacional, suas vantagens e os caminhos para que desfrutemos delas.*

As pressões para o livre-comércio começaram na Grã-Bretanha. Elas se iniciam intelectualmente com os economistas clássicos: Smith e Ricardo. O primeiro favorecia o livre-comércio argumentando que a liberalização alfandegária permitiria que os diferentes países se especializassem e dividissem trabalho aumentando suas produtividades; o segundo, pela definição do princípio das vantagens comparativas, um argumento definitivo. Com o tempo essas idéias tomaram o campo político e a o Reino Unido adota, enfim, com a abolição das Corn Laws em 1846 uma posição de abertura comercial.

No continente, os apelos para o livre-comércio aparecem depois. Na França, economistas como Frederic Bastiat advertiam contra os absurdos provocados pelo protecionismo em seu país. Em 1851 o governo de Napoleão III iniciou uma aproximação diplomática com a Inglaterra que culminou com o estabelecimento do Tratado Cobden-Chevalier.

O tratado estabelecia que a Inglaterra eliminaria suas todas as tarifas de importação relativas a praticamente todos produtos franceses, enquanto a França reduziria suas tarifas para um nível máximo de 30% ad valorem (a média se manteve em 15%), uma redução significativa.

Contudo, o aspecto do tratado de maior relevância para o comércio internacional foi a cláusula de nação mais favorecida. Ela estabelecia que se um dos países do tratado estabelecesse um acordo comercial com um terceiro país a uma tarifa mais baixa que a tratado, essa tarifa recairia também sobre os país do tratado original. Se, por exemplo, a França firmasse um tratado com a Espanha estabelecendo tarifas de 5% no máximo, esses 5% se estenderiam para a Inglaterra.

Como à época a França ainda possuia uma economia muito protecionista, outros países além do Reino Unido tinham interesses em tratados comerciais com os franceses. Esses países também foram tomados pelas pressões para o livre-comércio e estabeceram tratados entre si, todos com a de nação mais favorecida. Dessa forma, a medida que se estabeleciam os tratados, as tarifas comerciais na Europa diminuíram, promovendo uma era de livre-comércio. Entre 1830 e 1900 o comércio na Europa, medido pelo volume de exportações, aumentou mais de dez vezes.

As consequências desse desenvolvimento comercial são claras: houve uma reorganização na industria européia devido ao aumento da competitividade, muitas firmas ineficientes foram obrigadas a se modernizar ou fechar suas portas. O aumento de competitividade diminuiu os preços. O aumento comercial na Europa aumentou o bem estar dos consumidores, promoveu a eficiência técnica e desencadeou um aumento na produtividade.


* A análise aqui reportada é fortemente baseada em CAMERON, Rondo e NEAL, Larry. A Concise Economic History of the World: From Paleolitic Times to the Present. 4ª Edição. Oxford, 2003. Capítulo 12, p. 290-295.

6 comentários:

Pedro P disse...

"Entre 1830 e 1900 o comércio na Europa, medido pelo volume de exportações, aumentou mais de de vezes."

Aumentou mais de quantas vezes?
hehe

Anônimo disse...

Bom texto!

Joel Pinheiro disse...

Bom texto, Luiz.
Na minha aula de história do 3o colegial a professora jurava que o livre comércio era apenas da boca para fora, que as nações continuavam proibindo importações.
É óbvio que ela estava errada.

Luiz Felipe Amaral disse...

Mais de dez vezes. Faltou o "z". Correção feita.

Joel, a gente sabe que depois de 1873, principalmente com o crescimento do "capitalismo" na Alemanha houve uma reduçãodo comércio e um apelo ao protecionismo. O desenvolvimento alemão foi fortemente baseado no dirigismo estatal. Mas esses fatos não mudam o que você escreveu.

Joel Pinheiro disse...

Sim, inclusive mesmo no auge do período de livre comércio ainda haviam tarifas e barreiras.
Mas que houve um movimento na direção de diminuir esses obstáculos houve.

Luiz Felipe Amaral disse...

E definitivamente não era algo "da boca pra fora".