quinta-feira, julho 06, 2006

Quem Compra, Paga

Em uma vitória sem precedentes do livre comércio, o país A aboliu todas as suas barreiras à importação. Agora os habitantes de A compram todas as suas roupas do país B, que as vende muito mais barato. Bom, com o dinheiro que economizam na compra de roupas, a população de A tem comprado mais eletrônicos; no entanto, todos os eletrônicos que compram também vêm de B. Para falar a verdade, não há nenhum produto ou serviço antes produzido por A que B não exporte por um preço menor e qualidade maior: comida, filmes, livros, carros, artesanato, tudo! Depois da abertura comercial, não há nenhuma atividade a qual os habitantes de A possam se dedicar para ganhar a vida, pois não têm como competir com os produtores de B. E agora, o que fazer? Como ter certeza de que a mesma catástrofe social não ocorrerá em países do mundo real que decidam acabar com a proteção de suas indústrias?

Nenhum vendedor aceita dar seus produtos de graça. Pelo contrário, o dono da quitanda só me deixa levar um pé de alface se, em troca, eu lhe der uma certa quantia em dinheiro. Portanto, ele troca sua alface pelo meu dinheiro. Mas teria ele algum interesse no dinheiro em si? Por mais que se possa ver algum valor estético nas notas do Real, não é pelas imagens coloridas que se quer o dinheiro; o quitandeiro o quer para que possa, ele também, comprar produtos e pagar por serviços prestados por outros. E eu, que compro a alface, só ganhei meu dinheiro porque troquei algum serviço ou produto meu com alguma outra pessoa. O dinheiro é um mero substituto do que produzimos. Não preciso dar o que produzo diretamente para o quitandeiro em troca da alface; posso oferecer meu serviço a outra pessoa e com o dinheiro ganho comprar a alface. Toda venda e toda compra são, em essência, iguais ao escambo; o que muda é que uma das partes, ao invés de oferecer seu produto diretamente, oferece algo que pode ser trocado por produtos, o dinheiro. No fundo, troca-se trabalho de um por trabalho do outro. Se eu não tiver um trabalho, não poderei comprar a alface do quitandeiro (o fruto de seu trabalho).

Os vendedores estrangeiros também não vendem nada de graça. Tampouco cultivam eles algum interesse em colecionar moedas brasileiras. Se uma empresa de calçados americana vende sapatos no Brasil, isso significa que os EUA estão investindo recursos na produção de bens que estão sendo enviados para fora do país. Ou seja, os EUA estão mais pobres, pois uma parte do que produzem sai de suas fronteiras. Se mandam calçados ao Brasil, é porque recebem algo em troca (senão não mandariam). Com o dinheiro que recebem dos compradores brasileiros, os americanos podem comprar bens e serviços de outros países. Também os brasileiros, para poder comprar os produtos estrangeiros, têm que vender bens e serviços para fora do Brasil; se assim não fosse, estaria o Brasil recebendo produtos externos sem dar nada em troca: recebendo, na prática, doações gratuitas de sapatos dos EUA.

Como vimos, toda venda é uma troca; toda venda internacional também. Só compra um produto quem pode pagar por ele; ou seja, quem tenha algum bem ou serviço que possa oferecer em troca. Só posso comprar minha alface se eu também tiver algo de valor a oferecer a outras pessoas. Da mesma forma, os brasileiros só podem importar produtos se tiverem algo de valor a oferecer a outros povos.

O fictício país A, do parágrafo inicial, não tinha nada a oferecer ao país B. Tudo aquilo que A poderia produzir B produzia de forma mais eficiente. Ora, se A não tem nada a oferecer, B não dará nenhum produto para A, a não ser que queira fazer caridade. Conclui-se, portanto, que se um país não exportar nada, ele também não importará nada (assim como eu, se não tiver trabalho, não poderei comprar nada); as exportações são, na prática, o pagamento das importações. Os inimigos do livre comércio não têm nada a temer: se nosso país não tiver o que exportar, também não importará nada, e nossas empresas estarão protegidas.

4 comentários:

Anônimo disse...

vou usar esse texto prá ensinar pro meu filho como funciona o dinheiro
só falta explicar que uma nota pode valer mais do que até 99 juntas, e os números, etc, mas me poupou um grande trabalho
obrigado

Anônimo disse...

Simples e didático.

Luiz Felipe Amaral disse...

Boa Joel!

Mas e o dinheiro como reserva da valor? (hehehehe)

Joel Pinheiro disse...

Espero que tenhamos conseguido provar que todo protecionismo é fruto ou da ignorância ou da desonestidade.