quarta-feira, dezembro 01, 2010

Para que Serve a Filosofia?

Um amigo meu diz que no dia em que lhe apresentarem uma utilidade para a filosofia ele deixa de estudá-la. Em certo sentido, concordo plenamente: não dá para colocar uma finalidade externa à filosofia como tantos tentam fazer para justificar sua atividade.

Ganhar dinheiro, por exemplo, certamente não deveria ser o que motiva alguém a estudá-la. E se for, pobre dele. Agora, outras coisas mais bonitinhas também não podem ser de forma alguma: tornar o mundo um lugar melhor. Eu até entendo que é isso que motiva um estudante de geografia ou ciências sociais (um erro, mas um erro possível); mas se você está na filosofia, o que você lê e estuda é tão distante do espaço urbano opressivo das periferias, da fome da África e do aquecimento global que é impossível mantê-la como meio para tais fins. Só uma ginástica mental muito grave o permitiria. Claro, filósofos mudam o mundo para melhor (ao menos os bons). Platão e Aristóteles são mais importantes para a humanidade do que Mandela e Bono Vox. São consequências de suas ações, e não os fins. Um tratado pode mudar o mundo; mas quem acorde querendo mudar o mundo dificilmente quererá escrever um tratado. Todo mundo que estuda filosofia afirma, pelas suas ações, que considera uma questão abstrata a ser considerada solitariamente algo mais importante para si do que a pobreza e fome de uma boa parcela da humanidade.

Tornar-se uma pessoa melhor também não pode ser o objetivo do estudo de filosofia. Não que a filosofia não nos torne melhores. Mas ter isso como o objetivo quase certamente desvirtua a atividade filosófica, pois você colocará de antemão uma restrição extrínseca à sua própria razão quanto ao tipo de questão e posições que estará disposto a considerar. Além disso, embora possa ajudar o caráter, a filosofia (e mesmo a boa filosofia) é compatível com uma grande dose de vícios.

Mas tem uma finalidade que o estudo da filosofia tem que ter: o interesse intrínseco pela questão estudada. Se o cara estuda a crítica que Kant fez à metafísica, então ele tem que se interessar muito pelo que está em jogo nessa questão: a possibilidade de uma metafísica que fale da realidade em si, os limites do conhecimento humano, etc. Para quem se interessa pelas grandes questões do homem e do universo estudar filosofia é, portanto, muito útil. Se nem essa utilidade tiver, então está só perdendo seu tempo, ou pior: sob o pretexto “superior” da ausência de fins, está submetendo sua mente a fins muito inferiores, como a escalada de uma hierarquia de poder mesquinho da universidade ou exercitando sua vaidade para mostrar aos outros (ou a si mesmo) a própria inteligência e capacidade de dominar enormes sistemas intelectuais sem em nenhum momento preocupar-se com a realidade, que é o que motivou sua construção.

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