sábado, maio 12, 2007

Papa e Clero Brasileiro: Desnível

Quinta-feira passada, no encontro do papa com os jovens no Pacaembu, fomos abençoados com um belo discurso. Lá estava ele para nos ensinar como viver; os valores e ideais de vida que merecem nossa total dedicação; a união do ser humano com Deus por meio da Fé e da Caridade. Falou também dos sacrifícios e das lutas que necessariamente fazem parte de uma boa vida, e dos perigos com os quais nos deparamos. Prazeres, riqueza, poder; todos eles coisas boas, que podem servir de caminho para a santidade, mas que, se tomados como fins em si mesmos, rebaixam-nos à condição de quase animais.

Nesse mesmo evento em que o papa nos dizia coisas tão importantes, os bispos do Brasil não encontraram nada melhor para falar (e cantar!) do que a Amazônia. Nada sobre a alma dos brasileiros; o que anima os eclesiásticos brasileiros parecem ser as aves, os peixes e a água; sem esquecer, é claro, da boa e velha “realidade sócio-econômica e política”, que marcou presença nos discursos.

O triste fato é que a Igreja no Brasil, que deveria se preocupar principalmente com o lado espiritual e moral do homem (que é também o mais importante: aquele que nos diferencia dos outros animais), tem se preocupado apenas com o material. Assim, padres e bispos passam a se comportar e falar como membros de partido político; e como não têm formação adequada nesses temas, fazem um papel ridículo, pregando soluções absolutamente ineficazes (muitas vezes perniciosas) para problemas cujas causas não entendem.

Será que imaginam estar se aproximando mais “do povo”, e dos problemas reais dos brasileiros? Será que não percebem que os principais problemas de todos os homens são exatamente aqueles que têm sido deixados de lado? Ao reduzir o homem à esfera puramente material (justificando-se com uma suposta “opção pelos pobres”), o clero brasileiro deixa de oferecer às pessoas aquilo que elas (ricas ou pobres) verdadeiramente precisam. Não é de surpreender, portanto, que os mesmos pobres abandonem a Igreja em massa, em busca de respostas em outros lugares.

A “opção preferencial pelos pobres” é uma mentira. A Igreja de fato servia aos pobres quando rejeitava essa tentação demagógica e materialista. Ao se desviar do que deveria fazer, o clero brasileiro apenas se distancia da população (quem é que vai querer ir à Igreja para falar de “realidade sócio-econômica”?) e, ao se posicionar de forma absolutamente desastrosa em questões econômicas e políticas, contribui para intensificar os problemas que proclama combater.

Se a opção dos bispos brasileiros for realmente pelos pobres, e não pelo aumento do número deles, se realmente se preocuparem com o ser humano completo, corpo e alma, então devem parar com os discursos políticos, com as “pastorais” que fazem tudo menos levar as pessoas a Deus, e deixar que os cientistas e ambientalistas se preocupem com os peixes da Amazônia. De que adiantará ter salvado a vida de alguns peixes se os homens todos se perderem? O discurso do papa aos jovens foi um oportuno lembrete a todos nós sobre quais as prioridades que devem reger nossa vida. Que tenha sido também um alerta de despertar para nossos bispos!

8 comentários:

Anônimo disse...

Então Joel,
Concordo com vc em muitos pontos. Obviamente o papel principal da Igreja é qto à moral e à vida espiritual; mas é senso comum que sem vida material - visto que as pessoas precisam ser alimentadas e providas com as condições básicas para a manutenção de suas existências - não há a mínima condição para que a Igreja cumpra o seu papel, pelo menos não de forma efetiva. E seria uma falha muito grande se a Igreja - principalmente no Brasil - negasse por completo essa função social. Concordo que esse não deve ser de forma alguma o objetivo principal da Igreja, concordo também que alguns bispos podem até ultrapassar um pouco limites; porém, errar por caridade não deve ser tão grave. Assim sendo, a Igreja tem uma função social sim, e como vc estava presente na sexta feira pode partilhar disso bem mais do que eu, já que o papa deixou isso também evidente! Bem, isso não é uma crítica, apenas aminha opinião. Parabéns pelo texto!
Até mais!

Joel Pinheiro disse...

Obrigado pelos comentários, Rodrigo.

Concordo plenamente com você: a Igreja tem um papel importante também no lado material da vida humana. Afinal de contas, espírito e matéria estão intimamente ligados e não dá para cuidar bem de um ignorando o outro.

O que vejo como problema na Igreja no Brasil é o fato de se esquecer o espiritual. De encarar o material como fim em si mesmo.
E, para fazer a análise da economia, da sociedade, etc, usam categorias marxistas (mal-entendidas, diga-se de passagem), totalmente inadequadas.

Ou seja, mesmo tentando se ater ao estritamente material, propõe coisas que terão péssimas conseqüências materiais.
Restringem indevidamente seu campo de atuação e, dentro da área à qual se restringiram, atuam mal.

Anônimo disse...

Desculpe-me Joel, mas o que vc tem em mente quando diz "usam categorias marxistas"? Por favor, eu agradeceria se vc puder me esclarecer esse ponto.
Obrigado

Joel Pinheiro disse...

Acreditam que o trabalhador assalariado é, pela própria natureza de sua função, explorado pelo contratante, e que portanto ou devemos extinguir essa relação de trabalho ou ao menos que o Estado deva intervir pesadamente para mitigar os efeitos de tal exploração.

Falam em modos de produção (estaríamos vivendo sob o "capitalista") e os personificam, como se conceitos abstratos fossem entidades dotadas de intenção e características próprias: "os interesses do capital", "a lógica do capitalismo".

Adotam uma postura materialista quanto às crenças e valores humanos: são as características materiais da existência que levariam as pessoas crer e agir da forma que crêem e agem. Assim, o "capitalismo" levaria ao "consumismo", ao desejo desenfreado por bens, à ganância e à exploração.

Anônimo disse...

Bem, hoje o próprio papa na Assembléia do Episcopado falou que o liberalismo econômico não é cristão, visto que ele simplesmente aumenta a diferança entre ricos e pobres. E ainda segundo ele, todo e qualquer avanço econômico e social não deve ser restringir tão foremente como o liberalismo tem propiciado (muitas vezes às custas das classes mais baixas). Obviamente o caminho não seria também alguma política antidemocratica e esquerdista como vc disse. Assim sendo, concordo com vc que as vezes há um exagero esquerdista, mas acho que devemos tomar muito cuidado pois o exagero de direita também não é nada saudável. E isso o papa deixou bem claro hj.

Joel Pinheiro disse...

Se as medidas chamadas "liberais" aumentam a pobreza, como o papa afirmou, então elas são de fato ruins.

Mas, se as medidas, ao contrário, diminuírem a pobreza, então elas são benéficas, e não ruins.

Apenas a ciência econômica pode mostrar quais medidas e políticas atingem ou não esse fim de reduzir a pobreza.

Tenho tentado mostrar como, longe de aumentar a pobreza e de beneficiar os ricos às custas dos pobres, as medidas liberais são boas para a sociedade como um todo, especialmente para os mais pobres.

Elton Quadros disse...

Concordo com você, mas, não somente pelos discursos. Penso mais nos livros do Cardeal Ratzinger/Bento XVI e nos livros dos bispos brasileiros. Parecem estar anos luz de distância no que diz respeito à profundidade e precisão. Acabo de encomendar um livro de D. Odilo Scherer... espero encontrar aí um esperança no clero brasileiro.

Carlos César disse...

Caro Joel,
gostei muito do conteúdo do seu blog e do seu conhecimento e precisão com que trata os assuntos.
Temos muito em comum,pude notar pelos seus textos de politica e religião.

O Papa em sua mensagem aos jovens disse o que os mesmo queriam e precisavam ouvir.
A verdade é que a Igreja sempre teve essa dicotomia entre o poder temporal(politico) e espiritual, muitas vezes um sobrepondo-se ao outro.
A campanha da Fraternidade é muito mais politica do que espiritual e que deveria remeter à espiritualidade da Quaresma, mas se a Igreja assim o faz é porque realmente é necessário.Cabe a Ela saber ponderar isso. A Igreja proibe o envolvimento de seus ministros ordenados na politica, para justamente nao confundir o carater ministerial do sacerdote com o carater politico.Mas a propria Igreja no mais alto grau de sua hierarquia é justamente paradoxa.
É preciso equiparar a realidade espiritual - material.